[ ilustração por c h carneiro - via i.a. ]
resumo das notícias do dia
vamos morrer
mas não agora
vejam esta:
abaixo, do realismo até século 20
[ dante e gérion -- ilustração: carlos h carneiro -- via i.a. ]
aqui no sudeste faz frio, venta, multiplicam-se galhos e folhas pela rua. roteiro que lembra um livro lá de florença, itália. é junho.
no caminho, inferno a dentro, o poeta dante sente arrepios de pavor diante de
despenhadeiros, rios de fogo, poços fumegantes, fora a chance de ser morto por
um centauro imenso. é "a divina comédia", lá do século 14.
não há centauros, lá fora, mas o barulho do vento pela
janela incomoda. há notícia de pessoas sem casa ou sem teto. bueiros entupidos, árvore sobre carros e carros boiando em alagamentos. no rádio toca "meu santo tá
cansado" (o rappa). qual saída?
para dante, poeta virgílio o aconselha abraçar-se a gérion, um monstro, meio gente, meio
réptil, e assim poder passar de uma parte a outra, na busca de sair do inferno. ou seja, abraçar-se ao terrivelmente mau paa ter um pouco de paz...nesse caso, é literatura que fala?
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um pouco mais sobre "a divina comédia"
dizem que terapia é exercício para cérebro, mas nos últimos tempos tem sido mais que isso. pra começar, não caio na armadilha do "corpo e alma", como se uma coisa existisse por si só, separada dessa outra (anima) sem forma nem definição. fim da idade média. o humano, desde aristóteles, é animal racional e, aí, já entramos noutro problema com palavras. por que só ele o racional? uma coruja elabora seu trajeto até o ninho, depois até a presa, prepara seu vôo, ataca, enfim, está usando algum tipo de lógica, seu insitinto, digamos, racional. qualquer bicho articulado (com exceção do macunaíma) elabora, pensa e age de acordo com seu meio também, mesmo que seja para mudá-lo, como os castores e os humanos. pensar não dói.
olhem, tanto lou marinoff quanto marc sautet defendem o
bem-estar do homem pela fiolosofia. se ainda não conhece, deveria ler
"mais paltão, menos prozac", do primeiro, e "um café para sócrates", do segundo.
[ centro de ciência da luz ]
sim, tem novo livro saindo.
depois de "abolição via vargas", em 2021, agora vem "letra líquida".
estou com a editora viseu, desta vez. trabalho claro, acolhedor e desperta confiança.
bom, qual é a história?
narrador e amigo se vêem ligados a uma moça chamada moema. século 21. por um tempo, os três moram juntos, depois descobrem que a tal moça, na verdade... olhem, vou colocar um trecho:
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(...)
O começo de tudo foi assim: a igreja de Nossa Senhora d’Ajuda, abençoada e abraçada por Manuel da Nóbrega, o padre, é do século 16 também. Bahia. (...)
A região do Arraial é repleta de lendas que envolvem o tema da água que
jorrou para fiéis católicos. Água. E Moema, em sua alegre depois triste história
morreu onde? Na água. Guarde isso, vai servir, no fim da história.
Olhem, quando acontece um restauro de parte da igreja, lá no século 18, encontraram um pequeno baú de carnaúba, num buraco, feito uma vala, colado ao altar, sob o piso. Nele, havia panos velhos, rolos de papel esfarelento, uma moeda e pedaço de um quadro, em madeira, que parecia uma santa católica meio travestida de índia. Uma tupinambá.
[ letra líquida, ed viseu -- no prelo ]
não vou contar tudo, óbvio. aguardem!
vou avisar por aqui e no instagram: @carneiro_liter quando o livro estiver no ar! vai ser este ano de 2024!
quando : início do século 20
quem : augusto machado e gonzaga de sá
romance em 1a. pessoa: augusto machado
personagem central : manuel joaquim gonzaga de sá
por que ler: livro publicado em 1919 discute realidade brasileira pós-império, no rio de janeiro; expõe males da eugenia e escancara abismo que separa pobres daqueles que têm poder... e é obra do lima barreto
conflito: diferença de classe
veja o que falei do livro neste vídeo
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o que é seu, fica nos livros. a frase é minha mesmo, pode aparecer em alguma publicaçao, de repente… depende de muita coisa, mas a frase é boa.
nicolau é o nome de hoje. polônia, maio de 2010, pois que finalmente fizeram enterro oficial dele, o nicolau copérnico (1473-1543), chamado pai da astronomia. não é bem certo, talvez melhor ser tataraneto, porque os gregos, os egípcios ou os incas já faziam muitas coisas bem antes de nicolau, mas como tudo na vida é marketing, alguém ficou dizendo que ele era o pai, então tá.
o polonês,
além da formação em matemática, também estudou medicina e foi ordenado padre. a questão, para quem não sabe, é que nunca se conheceu, ao certo, o local, na
igreja, onde estaria o corpo do matemático. ele estaria na catedral de frombork,
junto a dezenas de outras pessoas, sem identificação precisa, desde o século 16. então, fuçando
em algumas ossadas e combinando com dna encontrado num livro que ele manuseava
– havia fiapo de cabelo nele –, chegou-se a uma conclusão: alguns ossos
encontrados, em 2010, na catedral de frombork, polônia, eram mesmo de copérnico.
o que era dele, tinha ficado nos livros.
um
arquiteto italiano, lá no século 18, dirigiu e organizou a construção da famosa
fonte de água, em roma. a tal fontana de trevi. muitos arquitetos trabalharam
ali por trinta anos, até ficar tudo pronto. a fonte não só refresca a vida de
quem passa por ali, como inspira as pessoas a pensar a respeito dos símbolos
erguidos: cavalos, mitos, colunatas de inspiração grega... ah, o nome do
italiano: nicola salvi. foi quem começou a coisa.
pois
é, aqui, no país tropical, o calor castiga. não há muito o que salvar, nem reclamar
porque, lá atrás, avisaram. queimadas, especulação imobiliária, ganância,
combustíveis fósseis etc, tudo traria problemas graves. é o que estamos
vivendo.
no conto "a terceira margem do rio", do rosa, um homem sobe num
barquinho reles e parte para o meio da água para nunca mais voltar. dizem que foi
o cansaço da vida em terra. outros falam do calor... alguns citam loucura. outros afirmam que era cruzeirense. não
importa. eu queria mesmo é a fonte.
[Vinícius de Moraes, 1938 – óleo – 56 x 47 cm - Portinari]
[Maria L Proença, 1938 –
óleo – 60 x 73 cm - Portinari]
durante
muito tempo, não soube que cândido portinari tinha feito retrato do poetinha. e
ainda jovem. folheando "para viver um grande amor", do
vinícius, achei uma crônica em que ele reclama com a filha susana, a posse do
quadro. ela, prestes a casar-se, levaria consigo a peça de portinari. a questão
era coerente: a nova namorada de vinícius (futura esposa) tinha sido também
retratada por portinari: maria lúcia proença. o traço do pintor traz uma
sobriedade que talvez não combinasse com ele, mas quem sabe do que se passa em
mente de artista? se susana devolveu-lhe o quadro, não sei. só garanto
que tenho um tanto de inveja desses anos 1930, 40, 50, no rio de janeiro,
por onde passaram figuraças da música, arquitetura, cinema, literatura… de
drummond a guimarães rosa, de vinícius a tom jobim... também clarice, maria martins, niemeyer, garrincha, cariocas ou não, estavam por lá, através do mundo da
política, arte ou simplesmente pela boemia. dizem que tempo bom é o que a
gente faz, então me acalmo… daí, não penso mais em um retrato meu, feito por
portinari… difícil. primeiro, o pintor está morto; segundo, vinícius não me emprestaria a camisa rosada.
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[ supreenda-se com uma personagem de lobato no meio de tudo ]
arte : caio gomez
o golpe militar, no brasil, aconteceu em 1964. faz tempo... deposto presidente joão goulart, em primeiro de abril tínhamos novo presidente, agora general. começou um período horripilante em nossa história, com tortura, mortes, censura e o fim do voto direto à presidência, dentre outras privações. a coisa toda durou mais de vinte anos e ainda ecoa. é importante relembrar. é importante tratar do assunto sim, principalmente, na escola. indico os filmes "pra frente brasil" (1983) e "zuzu angel" (2006), para ficar em dois, retratam com maestria o período. agora, há um outro, mais poético – se cabe poesia aqui – é "o ano em que meus pais saíram de férias" (2006), de cao hamburger, cuja narrativa se passa no primeiro semestre de 1970, já no governo médici. parte das filmagens se deu em campinas, são paulo. é o último filme de paulo autran. nele, o jovem mauro, uns oito anos, espera os pais voltarem, foragidos que estão em função da ditadura. duas imensas expectativas se apoderam do garoto: a volta dos pais e poder assistir, pela primeira vez, a seleção masculina de futebol, na copa do mundo, pela televisão. lembrar pelé, tostão, rivellino e companhia, necessariamente, é saudar também outros heróis, anônimos ou não, que morreram ou foram torturados em nome da liberdade civil.
criação arte: carlos h carneiro
na
crônica "sobre morte e morrer", machado registra: "qualquer
de nós teria organizado este mundo bem melhor do que saiu". é a
primeira linha. queria ter escrito isso, embora todo mundo diz tal
coisa com outras palavras, gestos ou até silêncio. organizar
o mundo é necessário, a começar pela vida própria. e pensar na morte esvazia um
pouco a ansiedade, acreditem. dá ideia de que algo pode ficar como legado. algo bom ou ruim, não importa. falando nisso, mortes na literatura: pode-se
começar por aquela quase suave em "iracema"; ou a sanguinolenta de
"a hora a e a vez de augusto matraga" ou ainda a intensa de madalena,
em "são bernardo". há outros tantos textos que passam pelo assunto
“morte”, como em "o cortiço" (efeitos da miséria), "noite na
taverna" (efeitos do álcool) ou "nove noites" (efeitos da
angústia).
numa
outra crônica "considerações sobre o suicídio", o mesmo machado
dispara: "(...) a questão do suicídio é antes resolvida no sentido da
fraqueza que no da coragem. é um problema psicológico fácil de tratar entre o largo do machado e o da carioca. se o bond for elétrico, a solução é achada em
metade do caminho".
discordo. quem bota fim na existência tem muita coragem.
uma
pilhéria ácida esse machado de assis (1839-1908).
* o nome "largo do machado" faz referência ao oleiro andré machado que, no século 18, era dono de terras no lugar
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BALANCETE
José Paulo Paes
A esperança: flor
seca mas (acaso
ou precaução?) guardada
entre as páginas de um livro.
A incerteza: frio
de faca cortando
em porções cada vez menores
a laranja dos dias.
O amor: latejo
de artéria entupida
por onde o sangue se obstina
em fluir.
A morte: esquina
ainda por virar
quando já estava quase esquecido
o gosto de virá-las.
[in "prosas seguidas de odes mínimas", cia das letras]
balancete : documento que mostra movimentações financeiras em um certo período, numa empresa; serve também para identificar prejuízo ou lucro
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numa gradação que indica fim de vida, "balancete" apresenta pequena lista de temas que são caros ao humano comum, como "esperança", "dúvida" (medo); "amor" e "morte".
aqui, cada tema é tratado de modo a expor o seu lado triste, estéril, num pessimismo digno de fim de século.
a flor entre páginas de livro dá falsa esperança de que ainda haveria vida por ali. agora, cortar laranjas em porções menores fornece ideia de um desespero, necessidade de guardar, de adiar o fim da fruta, adiar o fim da vida...
ao final, a morte seria esse virar de página, ou seja, uma passagem para outras esferas... interessante que, na primeira estrofe, a metáfora da esperança esteja num livro com flor seca dentro. ao final, nova metáfora envolvendo livro: virar página da vida. o fim.
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saiba mais:
willtirando
quando capitu saiu do rio de janeiro, foi pra suíça, com seu filho ezequiel escobar perto de si. anos mais tarde, o próprio ezequiel, adulto, volta para ao rio em busca de dinheiro, pois faria parte das pesquisas arqueológicas, nas pirâmides do egito. capitu já havia falecido. o final, você já sabe, ele morre por lá e o enterram, em jerusalém.
em 2010, cerca de 111 anos depois de dom casmurro ter sido lançado, pesquisadores suíços descobriram uma porta de 5 mil anos de idade… isso mesmo, na suíça. se estava fechada, não sei. mas para que serve uma porta, se não para abrir? qual porta você tem mantido fechada, ainda? fico imaginando quem deixaria uma porta tanto tempo trancada.
criação arte: carlos h carneiro - - via i. a.
o joão de barro, ao contrário do que o nome sugere, não é feito de terra. trata-se
do singelo passarinho, conhecido no meio ornitológico como
"furnarius". uma ave que constrói algo parecido com um forno. o joão constrói sua casa porque chega o momento de abrigar fêmea e ovos. ele faz o
ninho quando chega o momento da postura, da incubação. é trabalho para o presente, por conta do
desejo de viver.
freud fala
que a consciência não representaria o todo de nossa percepção do mundo. no dia-a-dia absorvemos energias externas, impressões, calores, humores e
ansiedades para lidar com nossos planos e os planos dos outros. até aí, as
coisas.
muita gente ainda crê que apenas a razão pode mover as pessoas para algum lugar. planos para o futuro, planos para filhos, planos para o cachorro.
hoje, dá pra dar tanto crédito assim ao futuro? acreditar em amanhã, normal, mas ficar só pensando nisso, fazer da vida um eterno trampolim de vento para o talvez é demais. melhor é a lição do joão.
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clica - leituras reflexivas - arrisca
no livro " f elicidade ", gianetti expõe que no século 18, o período iluminista apresentava uma equação que pressupunha uma harm...