domingo, 15 de junho de 2025

pedras no sapato

 


no livro "felicidade", gianetti expõe que no século 18, o período iluminista apresentava uma equação que pressupunha uma harmonia entre a busca da felicidade e o progresso da civilização. 

não é de hoje que se tem como senso comum que mais conforto material pode gerar melhoria nas ansiedades e até mais longevidade. o romance "a cidade e as serras" (séc 19) do eça de queiroz, vai na mesma linha, quando resume a felicidade ao grau de civilidade de uma pessoa. no final do livro, a teoria é mudada, mas fica o registro de um senso comum à época de eça: civilização é tudo. 
hoje, por onde houver um estudante de classe média fazendo vestibular, país afora, saberemos que a busca é por um curso que "dê dinheiro". nenhum curso dá dinheiro, a gente sabe, mas essa ideia é a cenoura na frente do cavalo. é a busca de felicidade que despreza o lado humano da coisa. e o que nasce primeiro : a busca de felicidade ou a do dinheiro ? 

o iluminismo perdeu ?

sexta-feira, 13 de junho de 2025

vídeos criados por IA decretam fim da realidade filmada

 



filmes feitos  por inteligência artificial vão decretando o fim do vídeo como recurso argumentativo para expor realidade. adeus documentários; adeus jornalismo investigativo ou mesmo para publicidade... tudo pode ser revertido, desdito e recriado ao gosto do freguês.

perigoso e cruel, esse recurso -- a inteligência artificial -- cria multiversos com raro detalhe e, no visual, comparam-se a uma realidade, de fato. são figuras mitológicas conversando, animais cometendo toda sorte de sandice humana, pessoas famosas falando besteira e por aí vai. por isso, escola!

então, hitler não se rendeu e morou na argentina? joão paulo segundo não sofreu atentado e atirou em si mesmo? palestinos estão recusando ajuda humanitária? presidente geisel era de esquerda? ... todas as mentiras que escrevi neste parágrafo podem se tornar imagens límpidas e, claro, dar munução a insensatos. 

por isso, escola. educar. aprender. conviver. argumentar. acolher e exercitar cidadania. deve haver mais verbos, mas por hoje chega.





quarta-feira, 4 de junho de 2025

tempo de viver e tempo de ...

 

                             
                             
                              [ cassandre, fred fichet ]

      

              viver é complicado

               viver é um arrastar-se

             entre o se e o talvez  

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   cassandre ou cassandra é filha de príamo, rei de troia e tinha a capacidade de fazer profecias

  por recusa a se envolver com apolo é amaldiçada por ele... por isso,     na foto acima, o gesto escolhido pelo escultor é muito rico 

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domingo, 1 de junho de 2025

será que pode colar? - uma chance ao aprendizado

 


o que há neste livro ?

perguntas de conhecimentos gerais com quatro (4) alternativas em que se buscou um nível de dificuldade próximo a quem estuda no ensino fundamental 2, algo entre o 6o. e o 9o. ano. 

por quê ?

nesse período da vida escolar, fundamentam-se alguns valores importantes, como a preservação da natureza, a importância da arte e a vida em sociedade.

como funciona o jogo ?

numa página do livro, aparecem a pergunta e as alternativas. é preciso descobrir qual delas é a única que responde à pergunta feita. quem tem o livro em mãos pergunta para uma ou mais pessoas, de preferência jovens. pode-se estabelecer um tempo para responder ou até alguma pontuação para o acerto.
na página seguinte está a resposta, acrescida de uma curiosidade e, por vezes, uma proposta de pesquisa.

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 veja um exemplo do livro:


Ave facilmente reconhecida pelo canto e parece dizer seu nome quando vocaliza. Ela apresenta faixa branca sobre os olhos. Quem é?

 

  a) sabiá


  b) bem-te-vi

  c) rolinha

  d) pica-pau

 

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 [ na página seguinte do livro ]

 

                               

           Resposta:     b) bem-te-vi


  Curiosidade:

O bem-te-vi é muito comum em áreas urbanas e rurais do Brasil. Ele recebe esse nome por conta do seu canto, que soa como “bem-te-vi”. Além de seu canto marcante, tem uma faixa branca característica na cabeça e o peito amarelo vibrante.

 

       Desafio !

Você consegue visualizar, em um dia, mais de cinco espécies diferentes de aves? Quais as aves típicas  que vivem em sua cidade ou bairro? 

Podemos fazer um competição, em um parque, na praça ou mesmo no quarteirão onde mora : quem consegue ver o maior número de pássaros em menor tempo!

 

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quinta-feira, 29 de maio de 2025

caminho de pedras - rachel de queiroz - resumo

 


caminho de pedras
- romance, 1937
rachel de queiroz  (1910  fortaleza - 2003  rio de janeiro)

na década de 1930 ligou-se ao partido comunista. a ideia era combater o varguismo e suas posturas antidemocráticas. foi presa. teve livros queimados em praça pública, assim como jorge amado, na mesma década. na cadeia, escreve "caminho de pedras".

sempre é bom lembrar que rachel -- apesar desse enfrentamento à era vargas -- apoiou o golpe militar de 1964 e deixa isso claro em algumas entrevistas, incluindo o famoso "roda viva", tv cultura, em que discute com caio fernando abreu a esse respeito.

voltando ao "caminho de pedras". 
o enredo: fortaleza. roberto está de volta à cidade, dez anos depois. enquanto espera alguém, em um café, olha para a rua tentando reconhecer a cidade de antes de sua partida. 

Roberto sentou-se melancolicamente à banca do café. O balanço do mar ainda Ihe ecoava doloroso na à cabeça. Esperava alguém. O sol queimava nas calçadas, (...) A pequena que servia os sorvetes, detrás do balcão de zinco, suava, e o batom empastado dos lábios derretia-se manchando-lhe os dentes. Roberto procurava reconhecer na cidade, no povo, nas mulheres, a sua velha Fortaleza de há dez anos. Mas o que via era novo, diverso, ninguém o reconhecia, nem ele reconhecia nada. 

um operário se aproxima e conversa com roberto. não diz seu nome. roberto diz que buscará trabalho em algum jornal da cidade. o operário afirma que irá apresentá-lo ao grupo, à noite. o plano todo era implantar uma célula comunista na cidade e roberto faria parte disso. em fortaleza, já havia o "bloco", também de teor comunista.

no início do capítulo 6, por exemplo, preto  vinte-e-um passa por roberto e faz questão e não cumprimentá-lo, pois um é proletário e o outro intelectual. havia uma combinação entre eles cuja orientação era não se reconheceram, na rua, operários e intelectuais. neste cap 6, samuel (judeu), filipe, paulino e nascimento (revisor do jornal "gazeta") estão numa praça conversando sobre a chance de conseguir mais mulheres fazendo uma revolução social.  nascimento diz que é um direito ter boas mulheres -- como a que viram num cartaz de cinema. o que se tem, nesta cena, é a noção de que mulheres bonitas são para ricos, os da elite. e, para os pobres, nada. logo, o movimento social poderia servir para que eles -- os comunistas -- fossem vistos como pessoas interessantes, pelas  mulheres, uma vez que estariam no poder. nascimento reclama que enquanto mulheres estão na rua, buscando homens, ele não é reconhecido e acaba mesmo é indo em grupo de homens para reuniões políticas.

Repetiam toda hora os “camaradas”, afetavam uma simplicidade excessiva, que chocava os outros, os “de tamancos”, cheios de preconceitos e convenções. Pois a simplicidade, longe de ser um atributo dos humildes, é um artifício de requintados que a plebe desconhece. Depressa essa diferença cavou divergências. Os “tamancos” entraram a hostilizar os “gravatas”, a “desmascará-los”, a exigir que se proletarizassem. O preto Vinte-e-Um chefiava a “esquerda”, e os “gravatas” se fechavam num círculo aristocrático, que chegava a incluir o próprio Filipe, expulso do meio dos obreiros por “intelectual” e por “burguês”.  

roberto conhece noemi, o marido joão jaques e o filho guri. com o menino, roberto é amável e até brinca com ele. apesar de roberto ser um destaque, a personagem importante, aqui, é noemi.  ela é ativa na política, quer aprender, conhecer mais a realidade e conta com apoio de roberto, mas não do marido. 

após conversas com roberto e a própria esposa noemi, joão jaques parte para o rio de janeiro, deixa a família. roberto encontra uma pequena casa, continua trabalhando para a organização. noemi, que há quatro anos trabalhava no estúdio "fotografia", acaba sendo demitida pelo patrão benevides, culpa das censuras dos clientes, ante a vida que noemi escolheu: viver com outro homem. noemi nasceu no acre, é filha do terceiro casamento da mãe.
o cerco aos comunistas aumenta. roberto diz a filipe que ele precisa ir embora, pois poderia ser preso. a própria organização convence filipe a partir para russas -- uma cidade do ceará. uma crise de saúde tirou a vida do menino guri. o desespero toma conta de noemi. ela e roberto, numa noite de sábado, enquanto entregavam folhetos, foram presos . ela, solta dois dias depois, uma vez que estava grávida. roberto foi levado para o sul. 

ao final, noemi consegue um emprego em uma casa de roupas. 

Pisou em falso numa pedra solta. Arrimou-se a um muro. (...) Noemi sorriu com a mão no ventre dolorido:
-- Mais devagar, companheiro!
E voltou a subir a ladeira áspera, devagarinho
                                                              [ fim ]

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  saiba mais 



terça-feira, 27 de maio de 2025

greve de vida - amèlie

 


há livros que me chamam atenção pela capa, e este é assim : uma menina, de vermelho, sentada na cama, entristecida, diante de uma gaiola com um passarinho igualmente entristecido e vermelho.

historinha simples, chamada "greve de vida", de amelie couture . a garotinha é lucie, de oito anos, está morando com o pai há pouco tempo, desde que sua avó falecera. era esta que cuidava da menina e a educava com carinho. entristecida, ela precisa aprender a conviver com a nova esposa do pai e seu pequeno bebê, luca. 
nada a faz sentir-se feliz, daí resolve não mais sair do quarto. faz isso por semanas seguidas, é quase assustador, tendo apenas a companhia de um passarinho em sua gaiola. mas o leitor experiente logo detecta a ponte para o desfecho possível. e não não vou contar aqui porque seria bobagem. 
mesmo que você já tenha passado a adolescência, vai se entreter com a novelinha e as ilustrações do marc boutavant. boa leitura.

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outras obras legais para leitores iniciantes 





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conheça o livro do conehcimento!




sexta-feira, 23 de maio de 2025

o caminho da arte

 


já fui um quadro empoeirado, esquecido na parede rachada de um casarão mofado. se bem que não era exatamente um casarão, porque não havia capelinha no quintal, nem piano dentro da sala. era só um terreno grande, piso de tijolo, coberto de telhas marrons. muita gente morou ali. gerações de plantadores de cana, pescadores, donos de supermercado, um casal de encantadores de serpente aposentados, um youtuber com depressão e duas bailarinas cegas. todos entraram, saíram, mas eu fiquei. quadro. parede, preguinho, pó. fiquei.

ninguém sabia quem me pintara nem o que exatamente eu retratava porque, aliás, mudava o tempo todo. pela manhã, aparecia um rosto deformado; à tarde, um campo florido; à noite, um bicho esquisito querendo sair de dentro da tela, como se o óleo ainda estivesse fresco. a moldura era circular o que facilitava a crença em supostas mudanças na imagem. diziam que quem passava tempo demais olhando para mim começava a ouvir sussurros, ou, pior, enxergar partes de si mesmo no quadro. era nojento.
houve quem jurou que a pintura era, na verdade, uma janela para outro lugar – daí ponderei que poderia ficar parecido com aquele livro do lewis carroll, da menina que cresce e diminui de tamanho, então, achei melhor endurecer feito um afresco. dito e feito: quem punha a mão pra saber se era mesmo passagem pra outra dimensão, errava, porque não dava pra atravessar. tentaram, mas não conseguiram. jogavam papel amassado, tampa de garrafa. até cuspe. com o tempo, cansaram, fui ficando esquecido, as traças me visitando. o que eu tinha, era isso: traças e um ou outro pesadelo de sabiá que entrava pela fresta da porta encarquilhada.
até que um dia, uma senhora de chapéu lilás entrou pela casa. dava pra ler seus pensamentos, porque, como sabem, sou arte. e o que havia? aquela senhora reconheceu o lugar onde algum antepassado teria vivido parte da infãncia, décadas e décadas antes. estava absorta e querendo recuperar alguma coisa que não vinha. resolveu limpar a parede, achando que eu parte do que havia ali era sujeira. a sujeira era eu. passou pano seco, reclamou da poeira, e bem ali, quando esfregou no canto, ouviu um estalo. rachaduras. parede, chão porta. trincas iam nascendo. teimosa, ela não correu. pegou uma lupa da bolsa e ficou encarando meu centro, onde se formava uma espiral esquisita, meio verde, meio preta, como um buraco sem fundo. o tremor havia cessado e ela, ainda de chapéu lilás, continuava sua expedição sobre meus traços e talvez até cores. riu baixinho, mexendo os beiços:  “que merda é essa?”

depois disso, a parede inteira começou a transpirar, como se estivesse com febre. e eu? me desfiz, escorri feito tinta fresca, me espalhei pelo chão até virar uma poça oleosa, cores difusas. antes de desaparecer, deixei só um detalhe pra trás: a pequena assinatura no rodapé, algo meio torto, que dizia "arte viva"

  

domingo, 11 de maio de 2025

um céu líquido

                                                                
                                                 [ picasso, mulher chorando, 1937 ]


em "vestido de noiva" (n. rodrigues), a personagem alaíde sofre alucinações em cama de hospital, vê figuras do passado, revive realidades.  a criatura de "frankenstein" (shelley) com certeza deve ter sofrido um tanto, logo após abrir os olhos amarelos, na alemanha. há outros aqui, na estante, sofrendo do mesmo mal, como naziazeno (os ratos), luís (angústia), quixote (d quixote), mersault (o estrangeiro), sidonio rosa (venenos de deus, remédios do diabo) ou mesmo capitão celestino (a visão das plantas).

a depressão é a primeira curva na estrada das alucinações. da depressão vai-se para crise de ansiedade num pulo. às vezes ela passa logo. crise de ansiedade é fogo. pouca gente acolhe, já adianto. é preciso ser bem transparente com quem está à volta. é preciso um psiquiatra. controlar respiração e contar com a sorte para ser acolhido por quem está fisicamente perto. a médio prazo, terapia ajuda muito. terapia não cura, mas ajuda a lidar com essa lama toda que é nosso exílio dentro da busca por identidade e acolhimento. é preciso parar de acreditar em empatia. isso é conversa de literatura. papo de publicidade pra vender apartamento ou aplicativo de mercado. por que pouca gente acolhe? porque, nesse mundo urbano em que tempo é dinheiro, pessoas estão preocupadas consigo mesmas. no máximo surgem no mesmo espaço físico, comem, bebem, mas não olham no olho querendo saber como estamos, de verdade. não recrimino. é só constatação. por isso, a causa de muitas angústias, depressões e afins é a solidão no meio das gentes que correm e vivem enterradas em suas próprias gavetas ou no aparelho celular. pessoas olham para seu próprio umbigo e, muitas das vezes, são educadas a serem assim como forma de se defender de possíveis dores. daí que, quando crescem, continuam olhando para si mesmas enquanto o próximo definha. 

voltando às figuras do primeiro parágrafo. não sei como se viraram esses personagens, porque estão sempre na curva, encostados, uns nos outros, na estante do quarto, um empurra-empurra secular, às minhas costas, agora, enquanto escrevo. não é boa a sensação, quando vem à mente "a queda da casa de usher" (poe) ou "a paixão segundo g.h." (clarice)... isso parece não ter fim. mas é só literatura.

quarta-feira, 7 de maio de 2025

resignação - narcisa amália - comentário

 


   RESIGNAÇÃO  - Narcisa Amália

 

No silêncio das noites perfumosas,

Quando a vaga chorando beija a praia,

Aos trêmulos rutilos das estrelas,

Inclino a triste fronte que desmaia.

E vejo o perpassar das sombras castas

Dos delírios da leda mocidade;

Comprimo o coração despedaçado

Pela garra cruenta da saudade.

Como é doce a lembrança desse tempo

Em que o chão da existência era de flores,

Quando entoava o múrmur das esferas

A copla tentadora dos amores!

Eu voava feliz nos ínvios serros

Empós das borboletas matizadas...

Era tão pura a abóbada do elísio

Pendida sobre as veigas rociadas!...

Hoje escalda-me os lábios riso insano,

É febre o brilho ardente de meus olhos:

Minha voz só retumba em ai plangente,

Só juncam minha senda agros abrolhos.

Mas que importa esta dor que me acabrunha,

Que separa-me dos cânticos ruidosos,

Se nas asas gentis da poesia

Eleva-me a outros mundos mais formosos?!...

Do céu azul, da flor, da névoa errante,

De fantásticos seres, de perfumes,

Criou-me regiões cheias de encanto,

Que a luz doura de suaves lumes!

No silêncio das noites perfumosas

Quando a vaga chorando beija a praia,

Ela ensina-me a orar, tímida e crente,

Aquece-me a esperança que desmaia.

Oh! Bendita esta dor que me acabrunha,

Que separa-me dos cânticos ruidosos,

De longe vejo as turbas que deliram,

E perdem-se em desvios tortuosos!...


    
 [ narcisa amália, nebulosas, 1872 ]


  notas_ 

  cruenta - violenta; dolorosa

  acabrunha – oprime, entristece profundamente

  elísio  -  referência a lugar mitológico de paz e felicidade

  empós  -  após; depois

  leda  -  alegre

  ínvios  -  caminhos árduos; difíceis

  rociada  -  orvalhada

  plangente  - o que lastima; entristece

  juncam  -  cobrem de folhas ou juncos  [ certo tipo de planta ] 

  turba  -  multidão; desordem

  agros abrolhos  -  lugares com espinhos


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em noites silenciosas, cheias de perfume, o eu lírico se lembra com carinho da juventude, quando a vida parecia leve, cheia de flores, e ela era feliz, correndo atrás de borboletas acreditando que o mundo seria melhor um dia, como nas letras do grupo cranberries. contudo, no presente, existe dor. mesmo assim, ela aceita esse sofrimento, porque é a poesia que dá sentido à sua vida. através dela, ela se sente elevada a outros mundos, cheios de beleza, natureza e imaginação. por isso, ela valoriza até mesmo a dor, pois se afasta das confusões do mundo (da turba que segue caminhos errados) e se aproxima da arte, que a faz enxergar tudo de forma mais clara, incluindo poder rever o passado. 

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saber mais?



sábado, 3 de maio de 2025

teresa teresa

 

                                                        [ tereza em êxtase - detalhe - ]


o conjunto de mármore e bronze "êxtase de santa tereza" (bernini, séc 17), dá conta de um estado marcante de contraste, no estilo barroco. um jovem risonho como um escobar machadiano, segura uma seta fálica bem acima da figura feminina, envolta em panos teocêntricos. ela parece mesmo em êxtase. está na igreja santa maria da vitória, roma.

"estou-me a vir", como dizem as portuguesas, seria bom nome para essa obra escandalosa aos valores do século 17. 

o jovem, apesar das asas cristãs, bem lembra cupido, filho de vênus, figura tão cara aos amantes universais. 
tereza é dita "santa". viveu no século 16 e registrou em texto seus encontros intensos e divinos com jesus -- ou similar. é o "libro de la vida". pesquisa e crê.



[ êxtase de sta tereza, séc 17 ]

                                        [ página do romance "letra líquida" - c h carneiro ]

     conheça este e outras obras de c h carneiro - clica!

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teresa teresa - - clica e vê
  


 

sábado, 26 de abril de 2025

robô selvagem - animação

 


assisti "robô selvagem" (peter brown), 2024, animação que contém as vozes de pedro pascal  -- para a raposa -- e mark hamill -- urso pardo -- dentre outros. lupita nyong'o faz a voz do robô. 

fábula quase distópica, "robô selvagem" navega entre a esperança e o caos com rara leveza, porque é dado ao robô a capacidade de aprender alguma coisa, graças a "astuto" -- a raposa -- e ao ganso "bico vivo", figuras que, em princípio, repelem o robô que caiu na floresta por acaso, mas depois o que se vê é uma simbiose entre esses três e, mais tarde, com todos da floresta.  com o tempo, os animais vão demonstrando que, apesar das diferenças, estão ali para ajudas mútuas. é um aprendizado que se dá graças às funções do robô. estranho, mas é verdade. é ficção, enfim.

com final previsível, "robô selvagem" sugere debate não só sobre preservação da natureza, como a necessidade de convivência com essas tais inteligências artificiais que, na verdade, apenas imitam poses e condutas de humanos. esses "robôs" -- desde "metrópolis" (lang, 1927) -- são feitos imagem e semelhança de humanos, o que, no limite, é a mesma coisa que o homem fez ao criar religiões. mas pouca gente está preparada pra esta conversa.

vale a pena ver "robô selvagem" como também ler "frankenstein" (shelley).

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veja o trailer oficial de "robô selvagem"



quarta-feira, 23 de abril de 2025

amor é um fogo que arde sem se ver - camões - comentário

 

                                 
                                    [ luiz vaz de camões 1524 - 80 ]


  
Amor é um fogo que arde sem se ver;
  É ferida que dói, e não se sente; 
  É um contentamento descontente;
  É dor que desatina sem doer. 

  É um não querer mais que bem querer;
  É um andar solitário entre a gente; 
  É nunca contentar-se e contente; 
  É um cuidar que ganha em se perder;

  É querer estar preso por vontade; 
  É servir a quem vence, o vencedor;
  É ter com quem nos mata, lealdade. 

  Mas como causar pode seu favor 
  Nos corações humanos amizade,
  Se tão contrário a si é o mesmo Amor?

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soneto publicado no livro "rimas", século 16. luís vaz de camões (1524-80)
texto mais famoso da língua portuguesa, até aqui. não arrisco dizer que é o melhor, mas o mais famoso sim.

e o que há neste poema? a busca de definição do amor. repleto de antíteses e paradoxos, o poema reúne contradições, opostos, para definir o sentimento amoroso que, no limite, seria algo turbulento, uma  mistura de razão e emoção. nas três primeiras estrofes, há uma lista de contradições. daí, a última estrofe traz a pergunta retórica instigante: se o amor é tão repleto de contradições, como alguém é capaz de buscar amizade (sossego) dentro dele? ou seja, como procurar serenidade em algo tão intensamente contraditório?
muitas leituras críticas deste poema insistem em afirmar que o texto não traz uma definição do amor porque o poeta está cheio de dúvidas. errado. os versos afirmam! o tempo todo afirmam que é uma comunhão de opostos! logo, a definição do amor está dada: é um jogo de contrários. o amor -- segundo o poema -- é um conjunto de sensações contraditórias. simples assim.

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  saiba mais


segunda-feira, 21 de abril de 2025

uma historiadora obstinada - chimamanda adichie

 


" uma historiadora obstinada"  -  conto do livro "no seu pescoço" de chimamanda adichie

"Muitos anos depois que seu marido morreu, Nwamgba ainda fechava os olhos de vez em quando para reviver suas visitas noturnas à cabana dela e as manhãs seguintes, quando ela caminhava até o riacho cantando uma melodia, pensando no cheiro de fumo dele, na firmeza de seu peso, (...) Outras lembranças de Obierika continuavam claras — seus dedos grossos envolvendo a flauta quando ele tocava à noite, seu deleite quando ela servia suas tigelas de comida, suas costas suadas quando ele voltava com cestos cheios de argila fresca  (...) Okafo e Okoye, os primos de Obierika, faziam visitas demais. Eles ficavam maravilhados com a habilidade de Anikwenwa para tocar flauta (...) mas Nwamgba via a malevolência incandescente que seus sorrisos não conseguiam esconder. Ela temia pelo filho e pelo marido e, quando Obierika morreu — um homem que estava saudável, rindo (...) — ela soube que eles o tinham matado com feitiçaria. (...) A morte de Obierika a deixou num desespero interminável. (...)

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o conto narra trajetória de nwamgba, mulher determinada da etnia igbo, na nigéria colonial. ela se casa com obierika, apesar da desaprovação de sua família, e enfrenta desafios como abortos espontâneos e a inveja dos primos do marido. quando obierika morre subitamente, nwamgba se vê sozinha para proteger seu filho anikwenwa dos tais parentes gananciosos. temendo que ele fosse vendido como escravizado, nwamgba decide enviá-lo para uma escola missionária católica. lá, recebe o nome cristão de michael. com o tempo, ele (anikwenwa/michael) se afasta das tradições da mãe, tornando-se um cristão rígido. ele rejeita os costumes igbo e até mesmo a comida de sua mãe. o tempo da narrativa se dá entre as décadas de 1940 e 70. século 20.

(...) Seus companheiros eram homens normais, mas também pareciam estrangeiros, e apenas um falava igbo, mas com um sotaque estranho. Ele disse que era de Elele; os outros homens normais eram de Serra Leoa, (...) Eram todos da Congregação do Espírito Santo; (...) estavam construindo sua escola e sua igreja lá. Nwamgba foi a primeira a fazer uma pergunta: Eles por acaso haviam trazido suas armas, aquelas que tinham usado para destruir o povo de Agueke, e ela podia ver uma? O homem disse que infelizmente eram os soldados do governo britânico e os mercadores da Royal Niger Company que destruíam aldeias; já eles traziam boas novas. Ele falou de seu deus, que viera ao mundo para morrer, e que tinha um filho, mas não tinha esposa, e que era três, mas também era um. Muitas das pessoas que estavam perto de Nwamgba riram alto. (...)

michael tem uma filha. a neta de nwamgba se chamava afamefuna -- batizada grace, nos costumes católicos --; ela herda o espírito questionador da avó. educada na cultura britânica, ela, mais tarde, percebe a importância de sua própria história e decide estudá-la. divorcia-se do marido que demonstrava não ter interesse nas raízes históricas da nigéria. tornando-se historiadora, grace investiga o passado de seu povo e escreve um livro desafiando a visão colonial. no final da vida, ela resgata suas raízes ao mudar legalmente seu nome para afamefuna, reafirmando sua identidade e homenageando a avó.

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segunda-feira, 14 de abril de 2025

marinar pernil com osso

 


os amigos tati e henrique precisam fazer um pernil suíno. assado, creio eu. pediram dicas. aqui vão.

em um aparelho de som qualquer, selecionar músicas do milton nascimento, lô borges, natiruts, anavitória, melin, os gilsons e liniker.

marinar o bicho: numa vasilha grande, a mais funda possível, colocar o porco dentro. se conheço pernil vendido por aí, costuma ter 1 kg e xis... então,  para este volume, recomendo um copo americano de azeite ou similar.  

dá pra espremer um limão inteiro também, de preferência o siciliano. 

despejar um copo e meio, pelo menos, de vinho branco. 

polvilhar páprica defumada, algo perto de duas colheres de sopa cheias. 

lemon pepper vai também. quanto de lemon pepper? não sei. um tanto bom.

sal também vai, claro. enquanto pensa no tanto de sal, vire o bicho no meio dessa gororoba que se constriuiu na vasilha.  

feito isso, o sal:  melhor é polvilhar  o equivalente a umas três colheres de sopa não muito cheais de sal... depois, espalhar sem cuidado a canela em pó: uma colher de sopa dá. continuar revirando o bicho nessa marinada. 

se for do gosto familiar, descascaria uns sete ou oito dentes de alho pra jogar na vasilha também. 

chame um dos filhos pra conferir a marinada. encoste a vasilha perto do nariz deles. se fizerem cara de tragédia, é porque está ótimo! o azedume do limão, com vinho já está contaminando todo o resto e é aí que mora a felicidade.

cobrir tudo com papel alumínio. embalar bem. pode usar um saco plástico pra envover 100%. , a vasilha e o papel laminado. botar na parte baixa da geladeira, de um dia pro outro. 

não esquecer a lista de músicas de mpb.

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  leitoras e leitores, querem saber mais sobre culinária despótica?

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sábado, 12 de abril de 2025

aparição - sophia de mello bryener andresen - comentário

                                    

 
     Aparição

  Devagar devagar um homem morre
  Escura no jardim a noite se abre
  A noite com miríades de estrelas
  Cintilantes límpidas sem mácula

  Veloz veloz o sangue foge
  Já não ouve cantar o moribundo
  Sua interior exaltação antiga
  Uma ferida no seu flanco o mata

  Somente em sua frente vê paredes
  Paredes onde o branco se retrata
  Seus olhos devagar ficam de vidro
  Uma ferida no seu flanco o mata
 
  Já não tem esplendor nem tem beleza
  Já não é semelhante ao sol e à lua
  Seu corpo já não lembra uma coluna
  É feito de suor o seu vestido
  A sua face é dor e morte crua

  E devagar devagar o rosto surge
  O rosto onde outro rosto se retrata
  O rosto desde sempre pressentido
  Por aquele que ao viver o mata

  Seus traços seu perfil mostra
  A morte como um escultor
  Os traços e o perfil
  Da semelhança interior.

         [ O Cristo cigano, Sophia de M B Andresen, 1961 ]

poema relata a morte de cristo, com um golpe no flanco, como descreve o novo testamento, quando da crucificação. contudo, o poema traz o nome "aparição". ou seja, alguma ressurreição.

agora, se liga nessa história: sophia breyner encontrou-se com joão cabral de melo neto, em sevilha, espanha, onde vivia o brasileiro que era também diplomata. lá, ela ouviu a lenda de que o escultor espanhol francisco gijón, no final do século 17, recebera uma encomenda de um cristo em agonia. para este fim, o tal artista buscou uma cena que pudesse ver alguém morrendo para conseguir inspiração e fazer seu trabalho. para isso, presenciou o esfaqueamento de um cigano e, assim, obteve material visual que precisava. depois de pronta a peça de madeira, muita gente reconheceu o cigano -- apelidado  "cachorro" -- e passaram então a chamar a capela onde a escultura está de "capela do cachorro". a obra é o "cristo de la expiración" ou "el cachorro de triana". 
na sequência, ele ressurge, já sem beleza nem esplendor. o rosto divino surge, porque é o rosto esperado pelo escultor do início do livro.  quanto mais vivia o anterior, humano, mais este que aparece ficaria morto. ou seja, era necessária a morte do primeiro para que o segundo rosto viesse, feito de dor, sangue, suor, que é o rosto mais conhecido pelas pessoas, os ditos fiéis e os nem tanto. quem esculpiu o novo rosto "de morte crua" foi a própria morte. ela, que já morava no primeiro cristo todo o tempo.

a influência no estilo, diz a própria poetisa, é de joão cabral -- citado nominalmente, no primeiro poema do livro, "a palavra faca". porém, a densidade é bem fernando pessoa, convenhamos. 

logo, de quem se fala em "aparição"? quem aparece?
sim, é a morte. nada mais.


segunda-feira, 7 de abril de 2025

teatro de bonecos popular potiguar - andré carrico

                                       

                   "o boneco quanto mais feio, mais bonito fica"
                                      
[ shicó do mamulengo ]


teatro de bonecos popular potiguar, editora escribas

andré carrico lançou seu livro em 2024. natal, rio grande do norte.
professor na universidade federal, andré -- além de doutor em artes cênicias -- é estudioso desta arte popular: o teatro de formas animadas. arte típica do nordeste. esses bonecos -- as formas animadas -- são conhecidos também como mamulengos e, quem os manipula, os brincantes ou calungueiros(as). basicamente, o material mais usado para criação dos bonecos é a madeira do mulungu, árvore do nordeste.

"Ele é feito , geralmente, por meio da manipulação de bonecos de luva ou vareta que podem apresentar articulações. (...) Os enredos envolvem quiprocós, pancadarias, piadas, danças, canções, loas, poemas de cordel e, às vezes, a presença de personagens históricos e mitológicos do repertório conhecido como cultura popular nordestina."    [ trecho ]

o livro contém vasto material de anos de estudo de andré carrico, desde as origens desta arte, com registros de possíveis ações de bonequeiros nas caravelas portuguesas do século 16, passando pela período da escravização negra do brasil colônia, até o séclo 21. 

teatro de bonecos é a brincadeira e a resistência, elementos marcantes na vida da cultura popular brasileira. acredito eu que, não só no nordeste, mas no país todo, arte popular é mais do que entretenimento ou ganha-pão. é resistência mesmo. uma defesa. 

"O teatro de bonecos potiguar é uma arte feita para acertar. Seu espetáculo, portanto, é criado para fazer rir e alegrar. Sua dramaturgia, via de regra, é constituída por esquetes sucessivos cuja duração é proporcional ao interesse da plateia. (...) Contam os mestres que antigamente as apresentações em bares da zona rural podiam durar de seis a oito horas".      [ trecho ]

uma das partes do livro de que gostei foi sobre shico do maumlengo, assim, com "s" mesmo. nascido em 1980, apaixonou-se pela arte do mestre chico daniel que ele conheceu ao ver um "dvd" de apresentações dele. shico se destaca porque expõe seus cinco sentidos na arte da manipulação dos bonecos. ele diz que ter conhecido a capoeira o ajudou nessa empreitada como calungueiro (brincante). como foi isso? ah, você vai precisar ler o livro.

"Cabe é refletir  a respeito das transformações e permanências, ganhos e perdas, que atravessam as brincadeiras populares e que fazem sobreviver em sintonia com seu tempo. Mudanças enriquecem as brincadeiras, desde que venham de dentro pra fora, e sejam sem concessões àqueles que, visando apenas o lucro, as descaracterizem ou as banalizem. (...) Pois, como escreveu Luís Antônio Simas, "A gente não brinca porque a vida é mole. A gente faz festa porque a vida é dura".    [ trecho ]

outras figuras marcantes desta arte como chico daniel, mestre felipe de riachuelo, mestra dadi, zé relampo, meste felipe, heraldo lins, emmanuel bonequeiro, genildo mateus e tantos outros -- vivos ou encantados -- compõem este livro cheio de história e documentação, abraçando a arte do mamulengo e, por causa disso, abraçando parte de nossa identidade. parabéns, calungueiros e calungueiras. parabéns, andré. 
ah, antes que me esqueça: esse moço autor do livro, andré carrico, foi meu aluno no ensino médio, no comecinho dos anos 1990, em campinas. isso é gratificante. 

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[ andré carrico ]

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  veja o que comentei - -


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