resignação - narcisa amália - comentário
RESIGNAÇÃO - Narcisa Amália
No
silêncio das noites perfumosas,
Quando a
vaga chorando beija a praia,
Aos
trêmulos rutilos das estrelas,
Inclino
a triste fronte que desmaia.
E vejo o
perpassar das sombras castas
Dos
delírios da leda mocidade;
Comprimo
o coração despedaçado
Pela
garra cruenta da saudade.
Como é
doce a lembrança desse tempo
Em que o
chão da existência era de flores,
Quando
entoava o múrmur das esferas
A copla
tentadora dos amores!
Eu voava
feliz nos ínvios serros
Empós
das borboletas matizadas...
Era tão
pura a abóbada do elísio
Pendida
sobre as veigas rociadas!...
Hoje
escalda-me os lábios riso insano,
É febre
o brilho ardente de meus olhos:
Minha
voz só retumba em ai plangente,
Só
juncam minha senda agros abrolhos.
Mas que
importa esta dor que me acabrunha,
Que
separa-me dos cânticos ruidosos,
Se nas asas
gentis da poesia
Eleva-me
a outros mundos mais formosos?!...
Do céu
azul, da flor, da névoa errante,
De
fantásticos seres, de perfumes,
Criou-me
regiões cheias de encanto,
Que a
luz doura de suaves lumes!
No
silêncio das noites perfumosas
Quando a
vaga chorando beija a praia,
Ela
ensina-me a orar, tímida e crente,
Aquece-me
a esperança que desmaia.
Oh!
Bendita esta dor que me acabrunha,
Que
separa-me dos cânticos ruidosos,
De longe
vejo as turbas que deliram,
E
perdem-se em desvios tortuosos!...
[ narcisa amália, nebulosas, 1872 ]
notas_
cruenta - violenta; dolorosa
acabrunha – oprime, entristece profundamente
elísio - referência a lugar mitológico de paz e felicidade
empós - após; depois
leda - alegre
ínvios - caminhos árduos; difíceis
rociada - orvalhada
plangente - o que lastima; entristece
juncam - cobrem de folhas ou juncos [ certo tipo de planta ]
turba - multidão; desordem
agros abrolhos - lugares com espinhos
. . . . . . . . . . . .
em noites silenciosas, cheias de perfume, o eu lírico se lembra com carinho da juventude, quando a vida parecia leve, cheia de flores, e ela era feliz, correndo atrás de borboletas acreditando que o mundo seria melhor um dia, como nas letras do grupo cranberries. contudo, no presente, existe dor. mesmo assim, ela aceita esse sofrimento, porque é a poesia que dá sentido à sua vida. através dela, ela se sente elevada a outros mundos, cheios de beleza, natureza e imaginação. por isso, ela valoriza até mesmo a dor, pois se afasta das confusões do mundo (da turba que segue caminhos errados) e se aproxima da arte, que a faz enxergar tudo de forma mais clara, incluindo poder rever o passado.
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