junho e julho. neste meio de ano, 2023, tive pelo menos duas crises brabas de ansiedade. já havia assistido outras pessoas próximas com isso, mas nunca vivido. vivi. sobrevivi. com impressão de que havia gripe ou algo do tipo, tive sensação de que sufocava... ora com secreção pela garganta, ora narinas inchadas dificultando respirar. some-se a isso entraves para cuidar de dente, medo de sair de casa, sono truncado, coração acelerado. o caos. em terapia, medicado e com família por perto, emergi. garganta é espaço de muita coisa, aqui. falar. calar. devia ser simples... falar é meu trabalho, há 37 anos. sala de aula. agora se há entrave aí, é recado da mente, do inconsciente, das estrelas, ou o que quer que seja, na obra das coisas vivas. resultado dos cuidados e reflexões: falar o que ainda não se disse é preciso... e o principal: pedir desculpas. é um caminho.
no meio do caminho, tinha uma pedra, tinha uma pedra no meio da vesícula. isso mesmo. pedras. neste dezembro, 2022, vou a hospital para procedimentos cirúrgicos e retirar o cascalho do órgão. não sei se a vesícula vai junto, não importa agora. falta pouco. dizem especialistas e os íntimos que vai ser tranquilo, que vai ser rápido e isso e aquilo. mesmo assim, fico tenso. no mundo do consciente e inconsciente vislumbro a possibilidade dessas pedras serem, de fato, um amálgama do que deixei de dizer, do que deixei de fluir. esse pacote nada lírico se forma e fica acumulado na gente. um efeito psicossomático de dentro pra fora esse segurar o verbo, segurar o gozo, a resposta e o gesto, em nome de sabe-se lá o quê. isso tudo pode sim ter sido acumulado, e o que era sombra, medo, ansiedade virou pedra. então, me sinto prestes a parir. quem sabe agora aprendo. falta pouco.
ultimamente, figuras próximas perguntam como estou. pra uns digo que estável, pra outros não. depende da hora, depende do lugar.
há antidepressivos, remédios para pressão, umas iguarias mais específicas para alimentação. e pedras. sim, pedras. neste ano, detectaram várias, na vesícula, e devem ser retirada ainda em 2022.
uma canseira essa expectativa porque, apesar da distância de 4 anos, ainda lembro direitinho da cirurgia para retirar câncer de próstata. lembro bem porque o pós-operatório parece não querer sair da cabeça. nem do corpo. impotência, algum desânimo, sensação de solidão, desmotivação... parece que a decisão sobre o que fazer da vida já foi tomada, aqui dentro. só falta pôr em prática. parece simples. não é.
há pouco soube que psiquiatra e terapeuta vão trocar ideia sobre o paciente remediado: eu. nada mal. importante esse registro. importante que troquem impressões. o paciente -- no caso, eu -- parece melhorar, mas isso é no campo da comparação e, no limite, especulação. no final dos anos 1960, por exemplo, eu estava ligeiramente melhor que hoje, com a desvantagem de não ter a menor ideia de como seria meu futuro. tinha entre 4 e 5 anos de idade. pelo menos não tinha depressão e nem sabia da existência da ponte preta. depressão é ruim, senhoras e senhores. bem ruim. quem não tem depressão sempre acredita que isso "uma hora passa". outros acreditam nos remédios, nos fitoterápicos, nos alopáticos, enfim, em algo que se possa ingerir ou esfregar e, pumba, começa o show. viva a tarja preta. só que não.
há alguns anos, ando por aí cerca de um centímetro do chão: engastalhado de comprimidos, alguma ansiedade e pressão alta.
o caminho para o outro lado desse mundo da depressão é algo que desanima... solidão é única certeza. ainda bem que, após 50 anos de vida, por instinto de sobrevivência, instalei um piloto-automático no meu cérebro, chama-se fingimento. então, com ele preparo aula, vou a mercado, tiro selfie com os próximos, boto água na planta, faço comida e até durmo. pouco, mas durmo. a sensibilidade aflorada não deixa digerir nada fora do simples. qualquer conflito vira um inferno... qualquer sensação de que um deslize foi cometido é motivo de quase pânico. perde-se a fome. existe a vergonha, a vontade de sumir. solidão.
já disse, em outro post, que ninguém vive nossa dor. é fato. mas com o fingimento você até pode fazer amigos. ele não funciona em terapias, já aviso. mas cabe bem no bar, na trilha, hora do lanche ou em formaturas.
terapeuta e psiquiatra devem ter algum plano. essa gente sempre tem.
enquanto espero, vou sentar e tentar descansar um pouco.
esses últimos vinte dias de junho foram movimentados demais. um misto de ressaca do mar e queda de meteorito. sentia que havia uma rave de babuínos dentro do peito. não vou entrar em detalhes, há mais vida lá fora e parece que vou melhorar. mas aprendi que em meio a ansiedades e frustrações o que resta é viver um dia por vez. dificílimo pra mim, porém cérebro é pra usar. tento beber e fumar menos, isso é fato. vou a médicos, tomo comprimido. existe a terapia. existe a movimentação física. existe o trabalho. existem pessoas em volta, ainda preciso acreditar em alguém... ansiedade, um dia ela vai embora. e você, que nem ansioso é, garanto que leu "fase", no título dessa croniqueta. frase boa é só uma fase mesmo.
2022: de 09 a 18 de junho, praticamente dez dias, estive em ribeirão preto, apartamento de pais idosos, ambos próximos dos 90 anos. minha mãe caiu, em abril, dentro de casa, quebrou fêmur. precisa acompanhamento o tempo todo; a memória falhando muito. meu pai já não tem o vigor de antes, memória vai enfraquecendo... eu e irmão decidimos, nesses dez dias, que os pais iriam para uma casa de repouso, lá em ribeirão preto mesmo. e assim se fez. é lugar com enfermeiras tempo todo e médico regularmente. fora outras pessoas para conversar e atividades físicas (musicoterapia, educação física, jogos de escrita, memória etc). o nó é a sensação que fica de desmembramento das rotinas de todos: eu, irmão e pais. cada um com sua ansiedade. cada um com seu touro selvagem dentro do peito. mas tenho ouvido de gente próxima que o que foi feito foi o melhor, o mais acolhedor etc etc. na casa de repouso os dois estão cercados de cuidados. é brisa que traz algum conforto. e estou procurando atividade física mais regular, para mim mesmo, como frequentar -- mesmo que irregularmente -- o pequeno espaço de academia aqui do prédio onde moro... deve ajudar. recebi energia de família, amigos, amigas, meus alunos, alunas, colegas de escola, figuras mais e menos distantes, isso anima e me berça. essas energias continuam me acolhendo. o muito obrigado, aqui, é o mínimo.
diagnosticado desde 2013 com essa tal circunstância, que atinge principalmente quem está vivo, a depressão fez estrago, por aqui.
remédios existem, mas são paliativos, geralmente. terapia, acupuntura, abraço na árvore, óleos essenciais, poesia de manoel de barros, café descafeinado, massagem, poemas de fernando pessoa, gol da ponte preta, estar com quem se ama, emagrecer pra entrar nas roupas, meu tempero para carnes, muita coisa fiz. muita coisa legal, mesmo. mas a solidão... a sensação de solidão ainda é o polvo de mil tentáculos. mil ou cem mil. pra quem tem depressão, qualquer avanço, qualquer momento sem ansiedade é uma nova galáxia. qualquer momento em que algo faça sentido é a saída do inferno. pra quem não tem depressão, os avanços do outro são sempre uma tentativa, um passo, um "continue assim" ou "não esqueça os remédios!" a terapia tem sido a parte boa, confesso. culpada pelo nascimento de "abolição via vargas" (veja o vídeo no final), as sessões me dão condição de ver as desgraças da gente organizadas. permitem que se manuseie a merda feita, as agruras do passado, dá até pra dar nome aos crimes. algo como aquelas luvas de usar na cozinha, pra pegar assadeira. a gente consegue, nas sessões, a longo prazo, mexer em tudo quase sem perigo. se ficar muito tempo segurando queima. oscilações de humor geralmente irritam quem está perto. eu sei. mas um dia chego. um dia. ou noite.
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um dos remédios legais contra depressão, foi esse evento, em março de 2022, com aval do parceiro ricardo aranha, da eptv
a idade chega e a gente acaba pensando o que é morrer de fato; o que é esse fim, quando vai ser, essas coisas. acho que sempre pensei na morte, mas, ultimamente, com mais regularidade. é da vida pensar na morte, então acostuma-se. deve ser a idade.
tenho pesadelos que passam por isso, essa coisa de achar que vai morer. tenho pesadelos, desde que me conheço por gente, acordo ofegante. me foi sugerido que talvez sofresse de apneia. é possível. já sofro de tanta coisa, mais uma não faz diferença. talvez devesse buscar solução específica. eufemismo. isso mesmo, "solução específica" é um eufemismo pra "fim". se não sabe o que é "eufemismo", mexa-se, não vou explicar agora.
aliás, me mexi, nesses últimos anos, buscando alguma harmonia física e mental, mas às vezes acho que serviu foi pra nada.
difícil essa constatação. mas é real. achar motivação para continuar combatendo os males não só da idade que avança, mas do contexto social do brasil de hoje é árduo. parece que o fim não vai chegar com alguma tranquilidade. violência contra natureza, contra muher, o racismo, a homofobia, os negacionistas antivacina... é muita tristeza! depressão, pré-diabetes, pressão alta, iminência de catarata, ansiedade e fã da ponte preta são alguns motivos para dormir mal quase sempre. durante um tempo achei que poderia ter algum acolhimento, poderia ter reconhecimento por esse ou aquele avanço em algum setor da vida, mas é ilusão. cada um tem sua via ápia pra seguir. cada um tem seu amazonas por remar. daí sobra qual tempo ou vontade pra acolher o outro?... ninguém viverá nossa dor. saber disso não ajuda meu estado, mas deixa claro o que esperar do dia seguinte.
"viver é muito perigoso", já escreveu guimarães rosa. nem precisava.
é perigoso sim porque a gente depende do rebote do outro, quase sempre. e quase sempre a gente vive em função do que o outro diz sobre nós. quando falo "outro" me refiro à sociedade como todo e àquele grupo determinado que nos cerca.
tenho depressão. fora isso, desde 2018, quando diagnosticado com câncer de próstata, venho buscando recuperar alguma autoestima. o tumor foi extirpado, estou vivo sim. mas tem essa busca por me restaurar. não é fácil. já a depressão... tento controlar... descobri que não posso exigir que qualquer outra pessoa viva minha dor, é fato. mas por vezes me pego tendo de explicar o que tenho -- depressão -- e isso vem cansando.
remédios há, terapia idem, são circunstâncias importantíssimas. a questão é o que a gente faz com isso.
tenho conseguido, acho, manter-me dentro das expectativas baixas. sem muito foguetório, sem poeira. até parei de engordar. na verdade, emagreci uns dois quilos, desde dezembro, até aqui, meio de fevereiro. ando querendo diminuir ansiedades, isso é verdade.
preciso acreditar menos que preciso autorização pra viver.
mas a pressão está alta (15 por 9). preciso exercício, dizem... antes do câncer até havia, mas depois, a sequela é bem essa: faltam ações que uma esteira só não cobre. que fase.
num muro perdido pela cidade pode-se ler: "finjo estar tudo bem pra não dar explicações"
é por aí a poesia do cinza. a narrativa de poeira e pedra que é essa solidão que a depressão entrega. praticamente ninguém entende. setembro amarelo é pra poucos. quase ninguém ouve... quem tem depressão precisa sempre fazer concessões, cuidar do que diz e suportar conselhos aleatórios, ouvir críticas à postura, ao tipo de terapia, jeito de falar, essas coisas... uma distopia. quem tem depressão precisa sempre dar explicação. e quase nunca adianta. setembro amarelo é um luxo. e para poucos.
às vezes tenho vontade nenhuma de me mexer, tenho sensação de que cada movimento, frase ou gesto resultará em tragédia ou, simplesmente, em nada, zero. às vezes há alguma euforia. do tamanho dos comprimidos que tomo. saúde mental é um coisa delicada. pouca gente entende. quase ninguém acolhe. tenho pesadelos recorrentes. nasci em dezembro, dia 19. e a história desse vírus "19" parece piada ruim. enfim, não fico pensando muito nisso, seria enxugar gelo.
já me considerei artista, educador, cozinheiro e fotógrafo. também motorista, herói da marvel, prefeito, falso nove, ator, guitarrista, fernando pessoa, gustavo kuerten, ridley scott e macunaíma.
o tema para redação 2020, enem (prova em janeiro 2021) foi saúde mental e seus estigmas.
vale sempre lembrar que em dezembro 2020, governo federal anunciou que encerraria programas ligados à saúde mental via sus.
os textos motivadores trataram de números sobre saúde mental, dando conta de que o brasil é o primeiro do ranking da depressão.
também se leu que redes sociais contribuíam para prejuízos na saúde mental, uma vez que buscam validar uma vida perfeita.
olhem, importantíssimo tema. assim como coronavírus não é "gripezinha", depressão -- por exemplo -- não é frescura (só pra usar um termo de um dos textos da prova). o estudante poderia seguir o caminho da prevenção, defendendo ideia de mais ofertas de profissionais especializados em espaços públicos -- como os do sus -- e isso levaria a argumentações ligadas aos benefícios da terapia, do apoio psicológico, principalmente em tempos de pandemia. ao final deste post, vídeo que fiz, em 2019, sobre saúde mental e outro sobre drogas (2020), dão ideia de que era importante para estudantes e professores tratarem do tema "saúde mental" permanentemente, quer seja pela depressão, quer seja pela busca de uma saída aos vícios a drogas lícitas ou não, dentre outras causas a esses desconfortos psicológicos.
em 2020, alunos da segunda série do ens. médio -- antonella e cauê, principalmente -- reforçaram uma ideia que tive sobre campanha comunitária ao setembro amarelo. foi ótimo o trabalho, mesmo com aulas remotas. estendi a ação para terceira série, recebi retornos muito bons de vários alunos também: maria fernanda, laura ferragut, joão, goya, bia melo, julia lopes e outros tantos.
numa ação que se chamou "ao vivo em debate" -- que criei com apoio da coordenação --, debati com professora amanda e alunos de nono ano e ensino médio o setembro amarelo, a questão do suicídio... foi bem produtivo.
espero que meus alunos que prestaram enem 2020, assim como outros tantos brasil afora, tenham feito boa prova. estudantes para quem universdade é ascensão social, segurança quanto a uma busca por prazer no trabalho.
já precisei de remédio pra dor. dor de cabeça, muscular, pra melhorar da cirurgia e até pro fígado suportar o que ingeria. também tomei remédio pra gripe, tosse, diarreia, dor de dente, má digestão. o gosto deles não lembro. mas tinham efeitos. geralmente resolviam a coisa.
joão cabral, poeta de nomeada, sofria de enxaqueca e dedicou poema para um comprimido. chama-se "num monumento à aspirina". é até bonito. mas poesia a gente não come, não dilui em água, não dá pra dizer que ela cura totalmente a solidão. pode ocupar determinado tempo, depois a solidão volta. há controvérsias... e há quem chame a dor da gente de nervosismo. outras dizem que é ansiedade. culpa é nome que serve, vez ou outra. medo é nome comum. depressão já ouvi também.
NUM MONUMENTO À ASPIRINA
João Cabral de Melo Neto
Claramente: o mais prático dos sóis, o sol de um comprimido de aspirina: de emprego fácil, portátil e barato, compacto de sol na lápide sucinta. Principalmente porque, sol artificial, que nada limita a funcionar de dia, que a noite não expulsa, cada noite, sol imune às leis de meteorologia, a toda a hora em que se necessita dele levanta e vem (sempre num claro dia): acende, para secar a aniagem da alma, quará-la, em linhos de um meio-dia...
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acho que todo mundo já passou por essa de sofrer solidão, angústia. uns mais, outros menos. remédios existem. alguns são de engolir outros de sentir. mas existem. poesia pode ajudar. pensei em chamar joão cabral e pedir opinião, consulta. poeta geralmente é bom na palavra. mas joão está morto. está sem dores, eu sei. mas morto. poesia e aspirina. vale a pena comparar uma coisa e outra?
não só porque em setembro pululam matérias ligadas ao tema da depressão. não só. é nebulosa e cinzenta a tal depressão, mas há controle médico, às vezes. o que não há é o controle do outro. difícil contar com a compreensão e empatia. o que se tem, do outro lado da ponte, é uma eterna ocupação consigo mesmo. pouco espaço, pouco tempo, "você não está ajudando" etc etc ... não só de medicamentos vive uma pessoa. há exceções, mas que só confirmam a regra: quem sofre de depressão costuma estar só. as campanhas dizem "fale mais"... quem tem moedas paga terapia, psiquiatra, cuidadores... aos demais, restam recados no fundo da caverna. até o próximo setembro.
ouço de gente com diploma na parede que o que falta na "molecada" (pura citação) que flerta com "baleia azul" é chinelada, pancada, cinta. um horror. quem bate, ensina ao que apanha que conflitos podem ser resolvidos pelo medo, pela violência, pela vingança... como, por exemplo, proibir algum tipo de prazer por causa de uma ação ruim. é ridículo. anos atrás, recebi em reunião escolar um responsável pelo aluno xis. o jovem ia de mal a pior, na escola, com notas baixas e auto-estima idem. pra piorar, o tal responsável disse que ia tirar o skate do garoto. eu não resisti, soltei; "senhor, de escola, seu filho sabe nada; skate é a única coisa que ele consegue e você vai tirar??" o problema das notas baixas nunca é o celular, o computador, a janela aberta, a televisão, skate, surf, nada disso. é o desinteresse pelo resto. dizer que o desinteresse é pura e simplesmente má vontade do jovem é um passo inteiro para jogá-lo na depressão e, hoje, na tal "baleia sem fundo". o que fazer com o desinteresse? algo de positivo se faz necessário, nunca o reforço negativo. quem dera que um médico só atendesse pessoas com saúde! não. é dos doentes que vive um educador, se não, ele não serve pra função. é preciso ter humildade e perguntar o que fazer diante desses problemas, ao invés do escárnio e da suposta busca de fazer graça. propor estratégias diferentes para abordar tal tema, em sala de aula; questionar; procurar ajuda, dentro da escola mesmo, dividindo experiência com colegas e direção (coordenação). não dá pra tratar todo mundo igualmente. acho mesmo espantoso que ainda existam adultos que acreditam que o que falta na educação é pancada. dá muita raiva. veja também