umidade relativa do ar cai a números críticos; incêndios nas matas, especulação imobiliária, crise climática; violência... a lista é enorme.
para quem quer mesmo vida menos sofrida, a esperança mora nestas próximas eleições, 2024. isso mesmo.
reconhcer grupos políticos -- partidos -- que valorizam a natureza; a ciência; respeito às diferenças e, claro, educação básica.
pesquise em sua cidade quais são os partidos com essas pautas e outras afins, como combate ao racismo, valorização da agricultura familiar, apoio a pequenas empresas, fontes energéticas renováveis, inclusão social etc...
reconheça esses grupos. anote os números desses candidatos e candidatas.
saudade cria vida, cresce e já quer até morar sozinha. corria o ano de 2008. gustavo guga, o "kuerten", despedia-se das quadras brasileiras, na bahia. ganhou editorial, na folha de s paulo, e mais umas notas em outros noticiários. pouco. três vezes campeão em paris, com mais de trinta finais em simples (23 troféus), oito títulos em duplas, chegou a ser o tenista número 1 do planeta, aplaudido pelo sorriso, pela sensibilidade, representando um pouco o filho que o brasil gostaria de ter. desde que getúlio vargas assumia o posto de "paizão" (que horror, heim), tivemos uma "namoradinha" (mais horrível ainda) e agora um filho, com certeza mais simpático que as citações anteriores. sinceramente, não gosto de paternalismos e creio que muito menos guga, sujeito que não se expôs muito em badalações televisivas e, por méritos da educação, sustenta uma fundação em santa catarina com seu nome. por conta dessa falta de vontade de guga em não anunciar sua saída num programa de auditório ou outras bizarrices de nossa mídia, tão pouco tenha se falado sobre sua aposentadoria. péssima a cobertura da despedida de guga. fica a tristeza pela falta de memória e respeito com quem sempre levou a bandeira do país às costas, sem pieguismo, e usou da imprensa para reforçar sua vontade de vencer com o esporte e ajudar, por tabela, o país a melhorar nesse quesito.
de 2008 a 24 são 16 anos, por aí. e por que falar disso agora? porque sim.
quem viu, em 2000, guga atropelar sampras nas semifinais, em lisboa, depois humilhar agassi na final, por três a zero, lembra-se de suas palavras, no discurso após a vitória, quando dizia estar feliz por também poder falar em seu idioma. no caso de guga, mais do que a pátria ser sua língua, agora ficará sendo também seu sorriso. valeu.
joão rubinato faz cento e quatorze anos, neste 2024. joão era o nome de pia. contudo, foi mais conhecido como adoniran barbosa. o primeiro nome vem de seu melhor
amigo e o sobrenome, uma homenagem ao cantor luiz barbosa. "saudosa
maloca" é um dos sucessos de adoniran. nascido na região de valinhos, s paulo, o compositor fez parceria com o grupo "demônios da garoa", mas
sua canção fica mesmo gravada no apelido do torcedor corintiano, o maloqueiro e sofredor. adoniran e corinthias são de 1910. olhem, se você que me lê não sabe o que é "maloca",
não sou eu quem vai explicar. se não sabe quem foi adoniran, aí precisa
nascer outra vez. o clube do parque são jorge também fez 114 anos, em 2024. gente como gilmar
(goleiro), rivellino (meia), gabi portilho (atacante) sócrates (meia-atacante), tamíres (ala) ou ronaldo (atacante)
foram campeões jogando pelo clube.
o maior público para uma partida de futebol, em s paulo, foi num jogo do time. era 1978. o adversário: a ponte preta, aqui de campinas. havia maisde
146 mil pessoas no estádio do morumbi. 142 mil só de corintianos. e o time
precisava apenas de um empate para ser campeão estadual, após 23 anos... e
começou marcando o primeiro. mas... na ponte preta havia um meio-campista
sereno chamado dicá. então, o time da zona leste paulista perdeu o jogo, gravando mais
forte a marca da penúria e do sofrimento, em sua torcida. na partida
seguinte, o clube seria campeão, mas isso é uma outra história.
joão rubinato é falecido (1982). adoniram fica pra sempre.
conheci murilo serediuk em 2024, começo do ano. valinhos, s paulo. ele, torcedor do guarani e eu, pontepretano, receita quase perfeita pra rusgas e piadas tortas. não foi.
ele estudava para vestibulares e eu tentava desbastar literatura para a sala, onde estava o tal amante do time verde de campinas.
numa dessas aulas, li o poema de alphonus de guimaraens, "ismália", século 19. na mesma cena, pedi pra ele -- murilo -- ligar o telefone celular ali, acessar a música "ismália" do rapper filósofo emicida e pôr pra tocar. ouvimos a canção, em sala de aula, que se ligava ao poema do alphonsus também. tudo muito lindo. num dos versos de emicida, a gente ouviu: "olhei no espelho, ícaro me encarou". discutimos essa relação alegórica entre o mito e a negritude -- tema da canção moderna, dentre outras análises e a vida seguiu, sinal bateu, saí daquela classe contente como em todas as aulas ali, cheia de gente acolhedora e que ri das minhas piadas só pra me deixar feliz. enquanto isso, ponte preta e guarani continuavam ainda na segunda classe do campeonato.
terminou? não.
corria o mês de agosto de 2024. por uma rede social, vejo que murilo rabiscou o braço com força e publicou.
eu adorei. mandei um "dez" pra arte dele. daí que veio isso.
não tem como não amar pessoa assim. mesmo sendo bugrino.
Pesca no fundo de ti mesmo o peixe mais luzente. Raspa-lhe as escamas com cuidado: ainda sangram.
Põe-lhe uns grãos do sal que trouxeste das viagens e umas gotas de todo o vinagre que tiveste de beber na vida
Assa-o depois nas brasas que restem em meio a tanta cinza
Serve-os aos teus convivas, mas com pão e vinho do trigo que não segaste, da uva que não colheste
mas que de alguma forma foram pagos em tempo ainda hábil
pelo teu muito suor e por um pouco do teu sangue Não te desculpes da modéstia da comida
Ofereceste o que tinhas de melhor
Podes agora dizer boa-noite, fechar a porta, apagar a luz
e ir dormir profundamente.
Estamos quites tu e eu, teu mais hipócrita leitor
[ prosas seguidas de odes mínimas, 1992 ]
. . . . . . . . . . . . . .
poesia que encerra a primeira parte do livro "prosas seguidas de odes mínimas", 1992.
são duas as partes, a saber: "prosas" com vinte textos e "odes mínimas", 13 poemas.
esta "ceia" evoca uma ideia de finitude. tem marca bíblica sim, do novo testamento. o catolicismo aparece em outros poemas, como "ao shopping center" e "a um recém-nascido", por exemplo. aqui, numa paráfrase da refeição clássica de cristo, o eu lírico (um leitor bíblico) se dirige a jesus: pede a ele que use peixe na ceia. uma atividade trivial que humaniza um tanto a figura divina. sabe-se que, no original do novo testamento, não havia peixe. é uma interferência do poeta. a presença da morte, no eufemismo "dormir profundamente" também traz o filho de deus para mais perto.
"dormir profundamente" lembra manuel bandeira e seu "profundamente".
no divertido "guia do turista brasileiro" (ed conteúdo), lúcio rodrigues e bebel enge alertam quem vai à fontana de trevi, em roma, e se entusiasma com o arremesso de moedinhas : "quem joga duas realiza um desejo qualquer (e quem joga três ou mais fica sem trocado para o ônibus)"
eu não sei quantas moedinhas você já perdeu, na vida, quer seja na fontana de trevi ou no riacho doce que corta sua cidade, não importa. jogar moedas pra cima ainda é tradição segura para tomada de decisões, por aqui, como numa aposta ou no começo do futebol. agora jogá-las pra perdê-las no fundo de uma fonte, já me parece bobagem, mas brasileiro é supersticioso até para escolher lugar na mesa pra almoçar, que remédio... será que alguém joga outra coisa, nas fontes, no lugar de moedas?
tinha aulas duplas, literatura, e a ferramenta mais usada para o trabalho era a garganta. giz e livro didático estavam valendo também. neste ano, fui cicerone de filosofia. isso: também dei aula, baseado no belíssimo livro de marilena chauí, volume único, cujo capítulo inicial era sobre filme "matrix". demais de bom também.
esta sala, registrada na assinatura do checão, era o 2-1mA1: "2" era ensino médio; "1" era primeira série; "m" para período da manhã; "a" para currículo em português e "1" o número da sala mesmo. e de onde veio essa sanha pelo milhão? durante as aulas, era comum eu oferecer um milhão de dólares para quem respondesse xis pergunta do livro ou que eu inventasse como desafio. puro jargão bobo.
eis que fim do ano, recebo um mimo. baita mimo. puta presente!
não consigo achar o cheque aqui, juro, mas, na época, fiz fotos. praticamente todo mundo rabiscou nele, ficou parecendo que tava sem fundo...
pessoas, fiz este texto em 2008, achei que podia colocar aqui, então vai.
2008. século 21. homenagens estão sendo feitas a três escritores importantes, de
nossa língua: pessoa (1888-1935), guimarães rosa (1908-67) e machado de assis
(1839-1908). ano de 2008 é data redonda para se relembrar gigantes da
literatura. relembrar, reler, mas não colocá-los em disputa, como fez a folha de s paulo, neste domingo, 22, com um caderno em que opinaram umas dezenas de supostos
críticos, alguns até querendo fugir do páreo e conclamando euclides da cunha
(era melhor então não ter aceitado convite do jornal). nem vou dizer quem
venceu a enquete, seria dar corda à falta de pauta do jornalão.
gente, vale a pena comparar rosa e machado? paulinho da viola e noel? mário faustino e joão cabral? carolina de jesus e conceição evaristo? zico e sócrates? mano brown e emicida? porsche e ferrari? feijoada e caipirinha?...
numa pesquisa publicada em maio de 2008, a mesma folha de s paulo
fez crer que o escritor preferido do grande público era monteiro lobato,
seguido por paulo coelho e jorge amado. três escritores diferentes demonstram
que o leitor brasileiro lê de tudo, menos os livros do sarney, mas isso já é
outra estante.
gonçalves dias fez um sabiá voar pelos versos do hino nacional, assim
como em "sabiá", naquele festival internacional da canção, em 1968. o poema do maranhense dias é publicado em 1843, trata de sentimento nacionalista,
a questão do exílio, a saudade... o brasil de 1968 era de um tempo terrível. chico e tom compuseram e cantaram "sabiá", tristíssima, um
contra-hino, merece lembrança sempre. eles cantaram mesmo debaixo de vaia, com aquelas burocráticas cynara e cybele.
tom e chico, pra mim, equivalem a esta dupla da foto, gilmour e bush. sério. acho isso mesmo... olhem, já no final dos anos 1970, só a tevê cultura, aqui por são paulo, passava
"clips" musicais. era o tv2 pop show. o que mais me
chamou atenção, pra sempre, foram duas imagens: o police, em
"every breathe you take", e a também inglesa kate bush, uma
descoberta de david gilmour. agora, os três temperamentais do "police" até
que se reuniram e passaram pelo rio de janeiro, em 2007, mas kate, já não sei mais por onde canta, se é que.
leio em camus que ser árvore ou galinha é algo mais lógico pois, nesses
casos, seríamos o próprio mundo, tal como a árvore, galinha ou um
riacho besta, perto da rodoviária. próximo disto, somos um estorvo. olhem, não
somos o mundo, fazemos parte dele. devia ser uma tragédia essa constatação, mas o humano faz questão de descolar-se desta equação e querer parecer mais do que o óbvio... daí, por que deveríamos manter a própria vida, se
ela, em si, parece esquisita, num mundo de aves, borboletas ou pedras? não há
nada que se pareça a um humano, nem mesmo saguis, do parque aqui ao lado. camus
é um alberto caeiro sem ressaca. o livro, alguns conhecem, "o mito de sísifo", um ensaio sobre o absurdo. coloco aqui um nervo exposto porque
esta é a razão de minha existência. certeza. ouça: "(...) toda a ciência
desta terra não me dará nada que possa certificar-me de que este mundo é
meu".
no mesmo capítulo, o existencialista e passional camus vai dizer que, com um
pouco de inteligência, sabe-se que o mundo é um absurdo. ou seja, abre
aspas : "o absurdo é uma paixão, a mais lancinante de todas. mas o
problema está em saber se podemos viver com nossas paixões, se podemos aceitar
sua lei profunda, que é a de queimar o coração que elas ao mesmo tempo
exalam".
o livro de camus, citado na primeira linha, é "o mito de sísifo".
há dois filmes marcantes, na linha da necessidade de superação,
quer seja ante a máquina ou diante de opressores de carne e osso. um é
"tempos modernos" (chaplin), 1936. outro, é "sindicato de
ladrões" (on the waterfront), 1954, com o impagável marlon brando em seu
melhor papel. a tradução, em português, ficou uma bomba, mas reina mesmo por
aqui mania de destruir os títulos originais.
brando faz terry maloy, irmão de um alto escalão na máfia portuária, mas que,
desde o início da narrativa, se mostra sensível. câmera em movimento, apelo à
trilha sonora e belíssimo figurino, "sindicato..." tem a seu favor,
não só a boa mão do diretor elia kazan, mas a denúncia da época do macartismo. parte do filme se passa no alto de um prédio, local de criação de
pombos-correio, viveiro pertencente ao operário morto no início. simbólico o
momento em que, após denunciar seus opressores (ex-amigos da máfia
sindical), maloy (brando) volta ao prédio e vê os pombos que cuidara com
carinho esfacelados pelo viveiro. maloy cuidava deles e, pelo que se nota,
parecia querer compensar sua participação no assassinato de seu dono. no
meio da história, maloy comentara : "vidão levam esses pombos,
heim?... comer, dormir..." mas os pombos, presos, estavam condenados,
assim como ele, que era lutador de boxe e teve de perder lutas para que seu
irmão e outros gângsters ganhassem apostas.
imperdível e aula de interpretação, tanto de brando como do padre que, literalmente, se converte à causa da justiça social.
um dos pilares da desmotivação de professores e professoras, por aqui, é a percepção de que se está aprisionado em um sistema "fordista" de trabalho em sala, ou seja, a divisão sumária do processo de ensino em categorias engessadas de aulas, como "matemática", "gramática", "geografia" etc... ou seja, para cada educador, só resta a tarefa de reproduzir o material didático sem poder se voltar também a temas atuais (racismo, política, preservação da natureza, homofobia, interrupção de gravidez etc) -- mesmo que relacionados à matéria -- sob pena de atraso no conteúdo. é triste.
sobram poucas opções:
1. reconsiderar o número de aulas por matéria (melhora até planejamento)
2. rever o material didático
3. união com outras áreas para lidar com atualidades
4. chorar
olhem, no limite, também é possível propor tarefas extraclasse aos estudantes envolvendo aqueles temas citados que geralmente ficam de fora da sala por conta desse aprisionamento de agenda e conteúdo. na verdade, há também um conservasdorismo em muitas cabeças diretivas que, deliberadamente, excluem esses conteúdos (cidadania etc) para agradar famílias muito conservadoras.
para isso, necessário é uma sintonia afinadíssima com a coordenação pedagógica.
romance da fase final da vida literária de eça de queiroz (1845-1900), "a ilustre casa de ramires" propõe uma espécie de paráfrase -- com algum humor -- para a trajetória política e econômica de portugal, desde a idade média, até o século 19.
personagem central, gonçalo mendes ramires, é o último fidalgo descendente de uma geração de ramires que sempre estiveram próximos da nobreza lusitana. ao final, o próprio joão gouveia, personagem, afirma que gonçalo é a representação de portugal.
por que injustiçado? porque leitores e leitoras do século 21 têm pressa. livros do século 19 -- em prosa -- não se encaixariam nessa ansiedade das gentes do tal século.
há muitas descrições ? sim. isso torna a narrativa lenta ? sim!
e o que fazer ? ler com calma. agora, se ficar insuportável, basta deixar de lado e procurar outra horta. nçao tem jeito. se quiser, pode ver o vídeo que fiz sobre o livro, logo aqui baixo.
olhem, é cultural da época, é do estilo do fim do século e início do séc 20, a narrativa lenta. está em dostoyevski, está em aluísio azevedo, raul pompeia, euclides da cunha, julia lopes... porque naquele tempo, predominava o determinismo, aquela tendência filosófica que acreditava ser o homem um escravo dos instintos e fruto do meio em que vivia. logo, fazia sentido o descritivismo de ambiente e de pessoas, o figurino, tudo, para poder justificar as ações dos personagens.