terça-feira, 18 de fevereiro de 2025

o baile - narcisa amália

 

          


    O BAILE

 

          Esta fingida alegria,

           Esta ventura que mente,

         Que será delas ao romper do dia?..

                               G Dias *

 

A noite desce lenta e cheia de magia;

A multidão febril do templo de alegria,

         Invade as vastas salas

O mármore, o cristal, a sede e os esplendores,

Do manacá despertam os mágicos olores,

         À languidez das falas.

 

Ao rutilar das luzes as dálias desfalecem..

Roçando o pó as vestes das virgens s'enegrecem.

           Enturva-se a brancura...

O ar vacila tépido... a música divina

Semelha o suspirar de uma harpa peregrina.

          E a hora da loucura!

 

Pela janela aberta por onde o baile entorna

No éter transparente a vaga tíbia e morna

           Do hálito ruidoso,

Da vida as amarguras espreitam convulsivas

O leve esvoaçar das frases fugitivas.

        O estremecer do gozo!...

 

E tudo se inebria: o lampejar de um riso

Acende n'alma a luz gentil do paraíso,

         Arranca a jura ardente!

E mariposa incauta, em súbita vertigem,

Arroja-se a mulher crestando o seio virgem

      Na pira incandescente!

 

Aqui, na nitidez de um colo, a coma escura

S'espraia em mil anéis, enlaça a fronte pura

          Auréola de rosas

Da valsa ao giro insano, volita pelo espaço

Do cinto estreito, aéreo, o delicado laço,

          As gases vaporosas.

 

Ali, na meiga sombra indiferente a tudo,

Imerso em doce cisma um colo de veludo

         Ondula deslumbrante:

Que fogo oculto, ignoto, em suas fibras vaza

Vivido ardor que faz tremer-Ihe a nívea asa

         De garça agonizante?!..

  

Além, meus olhos tímidos contemplam 

                                                      [ com tristeza

As penas da mulher dessa –  ave de beleza –

             Calcadas sem piedade!..

Esparsas pelo solo as laceradas rendas

As flores já sem viço.. abandonadas lendas

            Da louca mocidade!

 

A festa chega ao termo; a harmonia expira:

A luz na convulsão final langue se estira

            Pelo salão deserto

Há pouco o doudejar da multidão festante,

Agora – o empalidecer da chama vacilante,

           Ao rosicler incerto!

 

Depois a razão fria contando instantes ledos

De castos devaneios, de juramentos tredos

           Ouvidos sem receio...

Num corpo languescido o espírito agitado.

Ea febre da vigília ao doloroso estado

           Ligando vago anseio..

  

A vida é isto: hoje cruel grilhão de ferro;

Talvez d'ouro amanhã, mas sempre a dor, o erro,

            Aniquilando o gênio!

Passado – áureo friso num mar de indiferença:

Presente – eterna farsa universal, suspensa

            Do mundo no proscênio!

 

epígrafe: trecho de "o baile" -- em “últimos cantos", gonçalves dias 

    notas_

  olores  -  cheiros

  incausa  -  sem cuidado

  inebria  -  embriaga

  ledos  -  alegres

  proscênio  -  parte do palco de um teatro

  . . . . . .  .  .  .   .    .


"o baile", poema de narcisa amália, retrata uma festa luxuosa, com beleza e sedução, mas também permeado por atmosfera de desencanto.
a noite é descrita como mágica: perfumes, luzes e música, envolvendo os participantes em um êxtase quase hipnótico. contudo, por trás do esplendor, nota-se a presença da ilusão: flores murcham, vestes se mancham, a música se dissipa e a festa chega ao fim. 
a metáfora da mulher como mariposa é marcante: ela vê o brilho da festa e dos prazeres e se atira, mas é uma pira encandescente. deu ruim.

aqui, há contraste entre deslumbramento momentâneo e a realidade amarga da vida, marcada por erros, dor e desilusões. poema sugere que os momentos de alegria e paixão são passageiros e que a existência é um palco onde se encena uma farsa. 
novidade? é o romantismo.
  . . . . .  .   .    .     .

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sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025

no seu pescoço - conto - chimamanda adichie

              

"no seu pescoço", é um dos 12 contos do livro com o mesmo nome.
aqui, trata da experiência de akunna-- jovem nigeriana, 22 anos -- que se muda para os estados unidos após ganhar o
green card

o tema geral, aqui, é adaptação cultural dificílima de uma africana nos estados unidos. também se nota a questão do racismo. 

akunna chega aos estados unidos com a expectativa de encontrar oportunidade de trabalho e algum conforto, conforme idealizado por sua família... mas não acontece. no início da jornada, no novo país,  foi assediada por um tio: acaba fugindo,vai parar em connecticut

"(...)na verdade, ele era irmão do marido da irmã de seu pai, não parente de sangue. Depois que você o empurrou para longe, ele se sentou na sua cama — a casa era dele, afinal de contas —, sorriu e disse que você não era mais criança, já tinha vinte e dois anos. Se você deixasse, ele faria muitas coisas por você (...) Você se trancou no banheiro até que ele voltasse para cima e, na manhã seguinte, você foi embora, caminhando pela longa estrada tortuosa, (...) Perguntou-se o que diria para a mulher para explicar sua partida. E lembrou do que ele dissera sobre o fato de que, nos Estados Unidos, é dando que se recebe. Você foi parar em Connecticut, em outra cidadezinha, pois ela era a última parada do ônibus Greyhound que pegou. Entrou no restaurante com o toldo limpo e brilhante e disse que trabalharia por dois dólares a menos por hora do que as outras garçonetes.(...)"

enfrenta dificuldades para se adaptar à cultura americana: são valores diferentes dos seus; o racismo se manifesta de formas sutis e explícitas, desde os olhares e comentários de estranhos até as perguntas invasivas sobre sua origem. a relação de akunna com o namorado americano é ponto central aqui. ele a apresenta a um novo mundo, mas também a expõe a situações desconfortáveis com sua família e algumas contradições, como o fato de ter viajado para alguns países na áfrica, ma não demonstra acolhimento, e sim certa superioridade.  este namorado de akunna é personalidade complexa, uma vez que apresenta carinho pela nigeriana, ao mesmo tempo que não reconhece totalmente o sofrimento dela diante dos preconceitos que ela vivencia. akunna se sente atraída por ele, mas ao mesmo tempo percebe as diferenças culturais e de valores que os separam.

(...) Ele abraçou-a enquanto você chorava, fez carinho no seu cabelo e se ofereceu para pagar sua passagem, para ir com você ver sua família. Você disse que não, que precisava ir sozinha. Ele perguntou se você ia voltar, e você lembrou a ele que tinha um green card e que ia perdê-lo se não voltasse em menos de um ano. Ele disse que você sabia o que ele queria dizer, você ia voltar, voltar mesmo? Você virou de costas e não disse nada e, quando ele a levou de carro ao aeroporto, você abraçou-o apertado por um longo, longo momento, e depois soltou.
                                               
            [ fim ]

 o desfecho mostra akunna recebendo carta de sua mãe relatando que seu pai falcera cinco meses atrás. ela decide ir para nigéria ver a família. o namorado oferece dinheiro para passagem, ela recusa. no aerporto, ela o abraça e parte.

a narração está em 3a pessoa, na perspectiva de alguém que fala diretamente com ela. a dinâmica da narração parece ao de um julgamento, quando um juiz ou juíza faz relato das ações de um réu.

      . . . . .  .  .   .   .     .     .

o título "no seu pescoço" reforça o modo de narrar: referência ao outro, à 2a pessoa, logo, a narração está em 3a pessoa. 

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terça-feira, 11 de fevereiro de 2025

amor de violeta - narcisa amália

 


AMOR DE VIOLETA

 

    As violetas são os serenos pensamentos que

   o mistério e a solidão despertam na alma verdejante

   da esplêndida primavera.

                             Luís Guimarães Júnior

 

Esquiva aos lábios lúbricos

Da louca borboleta,

Na sombra da campina olente,

formosíssima

Vivia a violeta.

Mas uma virgem cândida

Um dia ante ela passa,

E vai colher mais longe

uma faceira hortênsia

Que à loura trança enlaça.

"Ai!" geme a flor ignota:

"Se pela cor brilhante

Que tinge a linda rosa,

a tinta melancólica

Trocasse um só instante;

Como sentira, ébria

De amor, de mágoa enleio,

Do coração virgíneo 

as pulsações precipites.

Unida ao casto seio!"

Doudeja a criança pálida

Na relva perfumosa,

E a meiga violeta

ao pé mimoso e célere

Esmaga caprichosa.

Curvando a fronte exânime

Soluça a flor singela:

"Ah! como sou feliz! 

Perfumo a planta ebúrnea

Da minha virgem bela!"

 

       notas_

   doudeja – age como louco
   esquiva  -  isolada  

   ebúrnea  -  feita de marfim
   lúbricos  -  com desejo físico; sensualidade
   olente  -  que possui odor
   exânime – desfalecido(a); desmaiado(a)
   célere - rápido

uma flor vivia isolada. era a violeta. de repente, uma virgem moça passa por ela e escolhe uma hortênsia para colocar no cabelo. a violeta se entristece e revela que por pelo menos um instante, pudesse ter cor diferente (de uma linda rosa, por exemplo) saindo assim do anonimato, podendo pertencer ao mundo da virgem que passeia. 

reparem que a tal violeta sonha em ficar perto do coração da moça para sentir os batimentos dele...

de repente, a tal virgem passa doudejando pela relva, pisa na flor, esmagando a violeta. para surpresa de zero pessoas, a romântica flor agradece e mostra que que conseguiu, pelo menos, na hora da morte trágica exalar seu odor, perfumando a planta que vai com a virgem. ou seja, é muito platonismo! é muita resignação! gente, como assim? a violeta além de desejar ser arrancada da terra para se emaranhar por alguns minutos nas tranças da moça, ainda fica feliz por ser pisoteada. 

com a profundidade de um pires, o texto expõe que a humildade e aceitação podem, num golpe do destino, construir um sonho. no caso, aqui, a pisada da virgem a fez acreditar que seu perfume chegou até onde está a outra flor. é inveja que fala?

ah, importante: personificação da natureza é ação típica do romantismo.

             . . . . . .  .  .   .    .

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domingo, 9 de fevereiro de 2025

será que pode colar ? jogo do conhecimento

 


você já imaginou um livro que transforma o aprendizado em uma aventura interativa e divertida? 

SERÁ QUE PODE COLAR ? não é apenas um livro de testes – é convite para explorar história, ciência, arte e muito mais de forma envolvente!

é simples: testes de múltipla escolha. reúna criançada e leia em voz alta uma questão por vez. em seguida, após as respostas, leia a curiosidade e a solução correta. 

criado por beatriz balau e carlos h carneiro, este livro foi feito especialmente para jovens de 9 a 13 anos, mas também cativa leitores de todas as idades. em suas páginas, você encontrará desafios instigantes, curiosidades surpreendentes e atividades criativas que incentivam a pesquisa e a reflexão.

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sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025

fantasmas - chimamanda adichie

 



"fantasmas": conto de chimamanda adichie, no livro "no seu pescoço"

em "fantasmas", professor de matemática james nwoye -- aposentado da universidade --, reencontra outro porfessor: ikenna, da área de sociologia. no passado, era combativo, exigia direitos melhores aos funcionários da universidade. james o vira pela última vez 37 anos antes, durante a guerra da biafra. era dado como morto, mas ikenna conta que foi para suécia.

a ausência do amigo ikenna okoro pode representar para o professor james uma lacuna em sua própria história e identidade. a ausência de ikenna não é apenas a falta de um amigo, mas simboliza também a perda de um passado que foi devastado pela guerra, pelas mortes e pelas mudanças irreversíveis.

a memória de ikenna pode estar associada a um tempo mais estável e promissor, antes da guerra transformar tudo em ruínas. assim, a ausência dele -- o professo ikenna -- funciona como um lembrete silencioso do que foi perdido: amigos, familiares, uma nação mais esperançosa. a conversa entre os dois gira em torno da guerra, da corrupção no país e as mudanças na universidade. james menciona que perdeu tudo durante a guerra e que seu pedido de pensão está emperrado por burocracia e corrupção. ainda bem, afirma james, que guardou dinheiro do tempo em que trabalhava no ministério.

além disso, para o professor j. nwoye, que vive uma existência tranquila, mas melancólica, ikenna talvez seja um fantasma não apenas no sentido literal — alguém que ele acreditava morto — mas também um símbolo das ausências que moldaram sua vida. o professor nwoy perdeu a primeira filha, na guerra, e ebere -- a esposa -- faleceu depois.

eis aqui as últimas linhas do conto:

Estou agora sentado em meu escritório, onde dei as notas dos trabalhos de meus alunos e ajudei Nkiru a fazer os deveres de matemática do ensino médio. O couro da poltrona está gasto. A tinta em tom pastel acima das prateleiras de livros está descascando. O telefone está na minha mesa, sobre uma enorme lista telefônica. Talvez ele toque e Nkiru me conte algo sobre nosso neto, sobre como ele foi bem na escola hoje, o que me fará sorrir, embora eu ache que os professores americanos não sejam rígidos o suficiente e deem notas máximas com facilidade demais. Se ele não tocar em breve, então eu tomarei um banho, irei para a cama e, na escuridão silenciosa do quarto, tentarei discernir o som da porta abrindo e fechando

                                          [ fim ]

repare que assim que james nwoye, idoso, se senta, chegam as lembranças do tempo em que sua filha estava no ensino médio e ele corrigia provas. é o passado. as lembranças de tempos tranquilos -- antes da guerra -- são um conforto. ikenna, professor tido como morto, também.

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quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

precisamos nos defender

 

                                                                 [ dahmer ]

são muias as notícias e informações trágicas: pessoas que matam outras por ciúme ou dívida, urgências climáticas, nazismo em alta, ganância, desmatamento...

precisamos nos defender.

num passado não muito distante, grupos da chamada esquerda ideológica pregavam um estado diferente, com distribuição melhor da renda e reforma agrária. hoje, a situação piorou demais, tanto que a chamada esquerda se ocupa agora em defender esse estado que está aí, ou seja: eleição; educação; saúde pública e a não privatização de serviços como luz e água. o básico. 

precisamos nos defender. 

um caminho é o exercício da argumentação. a leitura. a arte, a ciência, o esporte. compartilhar saídas para esse caos ultra conservador -- filho da ganância -- é urgente. escolas são locais propícios a este tipo de ação cidadã: feiras de ciência; mostras culturais; estudos do meio; ações coletivas em prol do meio ambiente; enfim, fazer do estudante um protagonista, para que ele propague a ideia da democracia necessária, o estudo que muda o mundo, a inclusão  e a noção de que, hoje, pelas eleições é possível salvar a sociedade do desmantelamento. 

precisamos nos defender. 

olhem, consciência de classe, voz para quem lê e se preocupa com o próximo, além de intepretação de texto, tudo isso é só o início. mas precisa acontecer porque precisamos nos defender.

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domingo, 2 de fevereiro de 2025

voto - narcisa amália - comentário

 


        VOTO

                     À MINHA MÃE

  

   Ide ao menos de amor meus pobres cantos

  No dia festival em que ela chora,

  Com ela suspirar nos doces prantos!

                        Álvares de Azevedo

 

A viração que brinca docemente

No leque das palmeiras,

Traga à tu'alma inspirações sagradas,

Delícias feiticeiras.

A flor gazil que expande-se contente

Na gleba matizada,

Inveja-te a tranquila e leda vida

Dos filhos sempre amada.

Só teus olhos rorejem délio pranto

De mística ternura;

Como silfos de luz cerquem-te gozos,

Enlace-te a ventura!

Os filhos todos submissos junquem

De rosas tua estrada:

E curvem-se os espinhos sob os passos

Da Mãe idolatrada!

Tais são as orações que aos céus envia

A tua pobre filha:

E Deus acolhe o incenso, embora emane

De branca maravilha!

                    [ narcisa amália, nebulosas, 1872 ] 


        notas_

  leda - feliz

  délio - relativo à ilha de delos, em tempos de apolo (grécia)

  gazil -  elegante

  silfos  -  seres espirituais ligados ao ar

  gleba  - porção de terra; terreno

  rorejar  -  gotejar; orvalhar

  junquem -  cubram-se de juncos

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eu lírico faz oferenda em forma de versos e dedica à mãe. revela que a vida alegre e tranquila dos filhos inveja o que agora possui a mãe, ou seja, esta deve estar em local perfeito, divino. a figura da mãe, aliás, é idealizada: trata-se de espírito sagrado. 

repare que o "embora", ao final,  parece marcar uma contradição: apesar da grandiosidade e pureza dessas manifestações místicas, elas são ainda frágeis ou pequenas diante do que a mãe merece. o "embora", explicita que o que vai ser ofertado é único, mas vem de uma figura singela e humana: a filha que ainda está na terra. 

este "embora" reforça a humildade do eu lírico: deus aceita as orações, mas elas vêm de uma criatura simples, como uma "maravilha branca", algo belo, porém efêmero. é  um misto de gratidão e reconhecimento das próprias limitações.
"branca maravilha" pode signficar a pureza do gesto que, mesmo humilde, modesto, se eleva com sinceridade e amor.

no contexto, claro, do séc 19 e o universo moral da poetisa, podemos afirmar que esta expressão "branca maravilha" é poética, simbólica pois une a fé e a simplicidade de quem envia as orações, ou seja, algo puro.

  . . . . . .  .  .  .   .

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sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

aflita - narcisa amália - comentário

 


    AFLITA

 

Per lui solo affido sull' ali dei venti

Il suon lusinghiero di garruli accentil

Deh riedi, deh riedi... mi stringi al tuo cor

E giorni beati vivremo d'amor!

            Il Guarany

 

Desde a hora fatal em que partiste,

Turbou-se para mim o azul do céu!

Velei-me na mantilha da tristeza,

Como Safo na espuma do escarcéu!

Até então o arcanjo da procela

Não enlutara o lago das quimeras,

Onde minh'alma, garça langorosa,

Brincava à luz de etéreas primaveras.

Mas um dia atraindo ao vasto peito

Minha pálida fronte de criança,

Murmuraste tremendo: "Parto em breve:

Mas não te aflijas, voltarei, descansa!"

Ai! Que epopeia túrgida de lágrimas

Na comoção daquela despedida!

Eu soluçava envolta em véu de prantos:

"Quando voltares, já serei sem vida!"

Desde então, comprimindo atrás angústias,

Vou te esperar à beira do caminho;

Voltam cantando ao sol as andorinhas,

Só tu não volves ao deserto ninho!..

Quando a tribo inquieta das falenas

Liba filtros nas clícias da campina,

Busco da redenção o augusto símbolo,

E faleço de amor como Corina!

Pois bem! Se enfim voltares desse exílio

Ave errante, fugindo à quadra hiberna.

Vem à sombra do val: sob os ciprestes

Comigo fruirás ventura eterna!

 

       [ narcisa amália, nebulosas, 1872 ]

 

   notas_

túrgida  -  inchada

clícia  -  parte de interna de algumas flores; pode ser referência a

      clície - ou clitia - (mitolog)  teve amor não correspondido

falena - borboleta noturna

liba - bebe (libar: beber em nome de alguém)

langrosa - melancólica

Corina de Tângra - poetisa grega, viveu entre os séculos V e VI a.C.

 

epígrafe: trecho da ária de ceci, ato 1, ópera "o guarani", de carlos gomes (1836-1896), é obra baseada no romance "o guarani', de j de alencar: "somente por ele confio / às asas dos ventos / o som prazeroso / de ruidosas inflexões! / Ah! volte, volte / aperte-me contra seu coração / e viveremos dias felizes de amor

 

a angústia no poema "aflita", de narcisa é motivada pela separação de uma pessoa amada. desde a partida dele, tudo na vida do eu lírico melancólico. ela descreve sua tristeza ao comparar a ausência dele a um céu nublado e um lago de sonhos escurecido. a angústia é intensificada pela promessa não cumprida de retorno.

os versos expressam um desejo de reencontro, mas também sugerem a perda de esperança com a passagem do tempo. a dor do abandono e a expectativa frustrada de rever o amado são elementos centrais que alimentam a angústia da poeta. 

safo, conhecida por sua poesia intensa e emocional, frequentemente explorava temas como o amor, a paixão e a beleza, muitas vezes com uma sensualidade marcante.

no contexto do poema, a menção a safo parece expor o sofrimento da poeta grega em meio às suas paixões e aos conflitos emocionais. "espuma do escarcéu" reforça a imagem de turbulência e entrega, comuns tanto na obra de safo quanto na própria experiência do eu lírico. ao final, o eu líroco revela que quando a pessoa que partiu voltar, o reencontro -- muito provavelmente -- será na morte, uma vez que ela já estará "sob os ciprestes", um eufemismo para túmulo. embora a sensualidade não seja explicitamente destacada, ela pode ser inferida como parte do mundo emocional descrito no poema, já que a poetisa safo é citada.

   . . . . . .  .  .  .   .   .



 

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