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quarta-feira, 18 de maio de 2016

a consciência do mal




 “o mito de sísifo” é um capítulo dentro do livro que leva este mesmo nome, assinado por albert camus, em 1943. ele, escritor modernista, lavado de existencialismo. 
penso nesse texto porque falo e falarei sempre de “a hora e a vez de augusto matraga”, do rosa, nosso melhor escritor. o livro em questão é “sagarana“, de onde “a hora e a vez…” é um dos contos. “sagarana” é palavra composta, meio germânica, meio tupi. numa tradução livre, teríamos “à moda de histórias épicas“. são narrativas míticas. aventuras que provocam reflexão. longe da realidade, o homem se realiza mais, penso eu.
voltando ao camus. sísifo é elemento da mitologia grega que é condenado a carregar uma pedra até o cimo de um monte. ela, por ser o que é, rola para a planície. sísifo desce o morro e faz o caminho de subida novamente. até que a pedra role novamente. isso seria o mal. o castigo? o castigo em si ou a consciência do trabalho inútil?
em “a hora e a vez de augusto matraga” pode-se dizer que o mal é a vingança que, para nhô augusto, se fazia necessária. não vou resumir a história aqui, não é isso que importa, nesse espaço. a questão é expor a ideia do mal para que, sustentado por alguma verdade, se tenha domínio sobre o medo do mal. não sei o que é pior, juro: um ou outro. o que faz matraga sair à revelia da razão, montado num jumento, pode não ser loucura, mas medo dela. matraga é figura criada para resolver questões à bala. como se sabe, passa quase sete anos, mais ou menos, no sítio do casal quitéria e serapião, regenerando-se. supostamente. provocado por joãozinho bem-bem e por seu próprio medo de não recuperar mais identidade perdida, matraga sai do sítio e vai ao seu destino. é redenção. é felicidade. é o enfrentamento do mal.
em “o mito de sísifo“, camus expõe sua curiosidade. diz ele: “Sísifo vê então a pedra resvalar em poucos instantes para esse mundo inferior de onde será preciso trazê-la de novo para os cimos. E desce outra vez à planície. É durante esse regresso, esta pausa, que Sísifo me interessa. Um rosto que sofre tão perto das pedras já é, ele próprio, pedra! Vejo esse homem descer outra vez, com um andar pesado, mas igual, para o momento, cujo fim nunca conhecerá. (…) Em cada um desses instantes em que ele abandona os cumes e se enterra pouco a pouco nos covis dos deuses, Sísifo é superior ao seu destino. É mais forte que o seu rochedo.
ter a consciência do mal não nos faz menos sofredores, mas é meio caminho para um enfrentamento. o mal não se resolve. um samba de vinícius vaticina: “tristeza não tem fim; felicidade sim”. 
se como muita gente apressada diz que o mal é o oposto do bem, então tudo é permitido. o mal seria um “bem invertido”. pausa para riso de escárnio. balela. se o bem é uma sensação de conforto, prazer, então temos um conceito abstrato para este bem. logo, se o mal for mesmo o oposto do bem, então ele não é uma ideia, uma abstração, sendo então possível encontrá-lo em um objeto, numa gaveta ou estampado em camisas. pois é. o mal sendo contrário do bem é raciocínio que interessa aos religiosos cristãos, nada mais. o mal como não-ser está presente desde antes de agostinho (séc V d.c.). se se pensa que o ser é o bem, então o mal é aquele nada. aquele que não é. difícil definir o não-ser sem apresentar contradição. à medida que se conceitua, se nomeia esse “não” então ele deixaria de ser o “não” para já ter alguma existência, mesmo que em conceito. mal é aquilo que acontece enquanto o prazer não vem. algo parecido com outro mito, o de tântalo. ele, castigado também, está numa região natural e, ao buscar água, esta se distancia; ao erguer-se para colher frutos, estes se erguem, em seus galhos, impedindo a tântalo de os alcançar. querer, desejar, é infinito. alcançar o equilíbrio da pedra no alto do morro já é sonhar demais…