A I A R A [ Olavo Bilac ]
Vive dentro de mim, como num rio,
Uma linda mulher, esquiva e rara,
Num borbulhar de argênteos flocos, Iara
De cabeleira de ouro e corpo frio.
Entre as ninfeias a namoro e espio:
E ela, do espelho móbil da onda clara,
Com os verdes olhos úmidos me encara,
E oferece-me o seio alvo e macio.
Precipito-me, no ímpeto de esposo,
Na desesperação da glória suma,
Para a estreitar, louco de orgulho e gozo...
Mas nos meus braços a ilusão se esfuma:
E a mãe-d’água, exalando um ai piedoso,
Desfaz-se em mortas pérolas de espuma.
[ in: Tarde, 1919 ]
notas - -
- iara: ser mitológico metade peixe, metade mulher, com feições indígenas é também conhecida no folclore brasileiro como mãe-d'água e, segundo lenda, atrai homens para o fundo do rio... quem consegue espcapar acaba ficando louco
- ninfeia: espécie de planta aquática
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- poeta, feito um narciso tupiniquim, vê na água o reflexo da deusa iara... na verdade, pode estar olhando para si mesmo, como se vê no verso 1
- ela parece oferecer seu corpo a ele
- ou eu lírico precipita-se então para agarrá-la com "ímpetos de esposo", ou seja, desejo sexual.
- iara o engana, deixando o poeta apenas molhado das águas do rio
- cheia de ironia -- talvez pena -- a mãe d´água solta um "ai", no final
- texto metrificado, segundo a lógica do parnasianismo: verso decassílabo
- há indício de loucura no poeta, logo no verso 1, quando afirma que a deusa do rio vive dentro de si, ou seja, o que ele vê, na água, seria seu próprio reflexo
- na verdade, versão tradicional do mito indígena é esquecida: iara, aqui no texto, é loira (cabelos "de ouro") -- poeta deve estar maluco mesmo...
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