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quarta-feira, 2 de abril de 2025

a rosa - narcisa amália - comentário

 



          A ROSA    -   
Narcisa Amália

 

      Que ímpia mão te ceifou no ardor da sesta

         Rosa d'amor, rosa purpurea e bela?

                           Almeida Garrett

 

 

Um dia em que perdida nas trevas da existência

Sem risos festivais, sem crenças de futuro,

Tentava do passado entrar no templo escuro,

Fitando a torva aurora de minha adolescência.


Volvi meu passo incerto à solidão do campo.

Lá onde não penetra o estrepitar do mundo:

Lá onde doura a luz o báratro profundo,

E a pálida lanterna acende o pirilampo.


E vi airosa erguer-se, por sobre a mole alfombra.

De uma roseira agreste a mais brilhante filha!

De púrpura e perfumes - a ignota maravilhal!

Sentindo-se formosa, fugia à meiga sombra!


Ai, louca! Procurando o sol que abrasa tudo

Gazil se desatava à beira do caminho;

E o sol, ébrio de amor, no férvido carinho

Crestava-lhe o matiz do colo de veludo!


A flor dizia exausta à viração perdida:

"Ah! minha doce amiga abranda o ardor do raio

Não vês? Jovem e bela eu sinto que desmaio

E em breve rolarei no solo já sem vida!


"Ao casto peito uni a abelha em mil delírios

Sedenta de esplendor, vaidosa de meu brilho;

E agora embalde invejo o viço do junquilho,

E agora embalde imploro a candidez dos lírios


"Só me resta morrer! Ditosa a borboleta

Que agita as áureas asas e paira sobre a fonte;

Na onda perfumosa embebe a linda fronte

E goza almo frescor na balsa predileta!"


E a viração passou. E a flor abandonada

Ao sol tentou velar a face amortecida;

Mas do cálix gentil a pétala ressequida

Sobre a espiral de olores rolou no pó da estrada!

Assim da juventude se rasga o flóreo véu

E do talento a estátua no pedestal vacila;

Assim da mente esvai-se a ideia que cintila

E apenas resta ao crente - extremo asilo - o céu!

 

                    [ nebulosas, 1872 ]


     notas_

 ímpia - não respeita o sagrado

 estrepitar - fazer barulho; vibrar com estrondo

 alfombra  -  extensão de relva

 gazil  -  elegante; de cores vivas

 crestava  -  queimava; tostava

 viço  -  força, vigor

 ébrio  -  que é tomado de sentimento intenso; bêbado

 ditosa  -  de boa sorte; bom destino

 báratro  -  local com grande profundidade

 junquilho  -  planta aromática

 embalde  -  em vão; inutilmente

 olor  -   cheiro; odor

 almo  -  bom; venerável

   . . . . .  .  .  .   .   .


eu lírico está melancólico. procurou no tempo da juventude alguma comepensação a esta tristeza do momento. mas encontrou uma flor morrendo. a conclusão, ao final, é que só resta ao crente aceitar o fim e ir ao céu. é uma esperança, na verdade. esta flor que morre é a representação da transitoriedade da juventude. apesar do viço, da beleza, ela acabará logo. é triste. é o romantismo.

  . . . . .  .   .    .


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quarta-feira, 15 de setembro de 2021

casamento do céu e do inferno - drummond

 


 CASAMENTO DO CÉU E DO INFERNO

No azul do céu de metileno
a lua irônica
diurética
é uma gravura de sala de jantar.
Anjos da guarda em expedição noturna
velam sonos púberes
espantando mosquitos
de cortinados e grinaldas.

Pela escada em espiral
diz-que tem virgens tresmalhadas,
incorporadas à Via Láctea, vagalumeando…

Por uma frincha
o diabo espreita com o olho torto.
Diabo tem uma luneta
que varre léguas de sete léguas
e tem o ouvido fino
que nem violino.

São Pedro dorme
e o relógio do céu ronca mecânico.
Diabo espreita por uma frincha.
Lá embaixo
suspiram bocas machucadas.
Suspiram rezas? 
Suspiram manso, de amor.
E os corpos enrolados
ficam mais enrolados ainda
e a carne penetra na carne.
Que a vontade de Deus se cumpra!
Tirante Laura e talvez Beatriz,
o resto vai para o inferno.
    [C. Drummond. Alguma poesia, 1930 ]

texto de caráter descritivo e narrativo, quase didático, opondo os conceitos de céu e inferno, ou seja, o mundo da salvação e o da perdição.
enquanto são pedro dorme e o relógio ronca de tédio, no porão -- parte baixa da casa -- corpos enrolados se amam.
essa "parte baixa" é alegoria do inferno e seus lugares-comuns: subsolo, escuridão, lugar de sofrimento etc.

ironicamente, o poeta pergunta se suspiram rezas. nada disso: suspiram de gozo carnal. é a vontade deles. vontade de deus. logo, esse tal inferno parece ser lugar prazeroso.
laura e beatriz são figuras divinizadas, no livro "a divina comédia", de dante alighieri.
vale sempre a pena lembrar os textos de william blake, inglês, 1894. ele publicou livro com este nome: "casamento do céu e do inferno".  traz visões por vezes pagãs das vontades humanas. é inspirador.


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segunda-feira, 14 de setembro de 2020

os canalhas não suportam poesia


                 rafael corrêa, cartunista, século 21

não é de hoje que os canalhas não suportam arte.

sabemos de censuras, no país, desde gregóprio de matos, lá no século 17.

houve censura a caetano veloso, geraldo vandré, graciliano, cassandra rios,  jorge amado... dentre outros tantos e tantas.

os canalhas são violentos; canalhas espalham notícia falsa, ele são individualistas, odeiam escola, ciência, arte, mulheres, pretos, indígenas, são o que são porque o brasileiro em geral sempre sonhou em ser da casa grande. e para ser da casa grande, precisa se comportar como tal. daí a truculência, corrupção, o estar acima da lei, o desprezo pela ciência...

queria muito que a vida melhorasse.

é clichê, eu sei. vida melhor. queria vida melhor...

prefiro o clichê a esse amargo na boca.

quero mundo melhor.

pedras no sapato

  no livro " f elicidade ", gianetti expõe que no século 18, o período iluminista apresentava uma equação que pressupunha uma harm...

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