LÁGRIMAS OCULTAS
Florbela Espanca [ 1894 - 1930 ]
Se me ponho a cismar em outras eras
Em que ri e cantei, em que era q'rida,
Parece-me que foi noutras esferas,
Parece-me que foi numa outra vida...
E a minha triste boca dolorida
Que dantes tinha o rir das Primaveras,
Esbate as linhas graves e severas
E cai num abandono de esquecida!
E fico, pensativa, olhando o vago...
Toma a brandura plácida dum lago
O meu rosto de monja de marfim...
E as lágrimas que choro, branca e calma,
Ninguém as vê brotar dentro da alma!
Ninguém as vê cair dentro de mim!
[ Livro de mágoas 1919 ]
soneto decassílabo de florbela da conceição espanca.
a palavra "querida" sofreu uma supressão de sílaba para que pudesse manter o verso 2 com a mesma métrica dos demais.
com exclamações e reticências, o poema expõe um eu dilacerado, ferido, pois o presente não é como o passado. nele, houve primaveras, ou seja, felicidades, prováveis amores... depois, como se lê no verso oito, abandono e esquecimento.
o título faz referência á tristeza da alma, interna, daí o termo "ocultas". ninguém pode ver porque caem dentro do próprio eu.
poema pessimista e de influência simbolista: subjetividade; valorização da espiritualidade; apego ao que é vago, impreciso.
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