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segunda-feira, 5 de fevereiro de 2024

terça-feira gorda - caio fernando abreu - comentário

 

                                                      caio fernando abreu (1948 - 96)

o texto se inicia com a descrição de uma dança sedutora de um homem para outro homem,  sendo este último, o narrador. 

De repente ele começou a sambar bonito e veio vindo para mim. Me olhava nos olhos quase sorrindo, uma ruga tensa entre as sobrancelhas, pedindo confirmação. Confirmei, quase sorrindo também, a boca gosmenta de tanta cerveja morna, vodca com coca-cola, uísque nacional, gostos que eu nem identificava mais, passando de mão em mão dentro dos copos de plástico. Usava uma tanga vermelha e branca, Xangô, pensei, lansã com purpurina na cara, Oxaguiã segurando a espada no braço levantado, Ogum Beira-Mar sambando bonito e bandido. Um movimento que descia feito onda dos quadris pelas coxas, até os pés, ondulado, então olhava para baixo e o movimento subia outra vez, onda ao contrário, voltando pela cintura até os ombros. (...)

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o trecho lembra os movimentos de rita baiana, em "o cortiço", do aluísio azevedo, 1890.
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Entreaberta, a boca dele veio se aproximando da minha. Parecia um figo maduro quando a gente faz com a ponta da faca uma cruz na extremidade mais redonda e rasga devagar a polpa, revelando o interior rosado cheio de grãos. Você sabia, eu falei, que o figo não é uma fruta mas uma flor que abre para dentro. O quê, ele gritou. O figo, repeti, o figo é uma flor. Mas não tinha importância (...)

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a sequência é o envolvimento dos dois homens, durante um baile de carnaval. o primeiro, além de seduzir o narrador em meio a sua dança e a proximidade dos corpos suados, oferece droga a ele -- narrador -- que, apesar de negar no início, aceita. eles vão à praia, saindo do salão; se envolvem pela areia.
na sequência surgem muitas pessoas. elas espancam a dupla. o narrador não consegue ajudar seu parceiro. foge.

 Fechando os olhos então, como um filme contra as pálpebras, eu conseguia ver três imagens se sobrepondo. Primeiro o corpo suado dele, sambando, vindo em minha direção. Depois as plêiades, feito uma raquete de tênis suspensa no céu lá em cima. E finalmente a queda lenta de um figo muito maduro, até esborrachar-se contra o chão em mil pedaços sangrentos.       
                                                        [ fim ]
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a queda do figo representa o fim trágico, dolorido, da paixão. figo pode sim ser um símbolo fálico,  símbolo da relação homoafetiva, ali, entre eles. 
as referências a xangô, iansã, oxaguiã e ogum dão o tom pagão, mais orgânico à relação homoafetiva. vale lembrar que o texto é do século 20, saiu em 1982. lá, a questão da homossexualidade era ação condenável, praticamente um crime. vide o desfecho desta narrativa. as bênçãos de orixás africanos são a verdadeira justiça para essa ação amorosa e, claro libertadora.
figo e plêiades -- em "terça-feira gorda" -- são alegorias de desejo. ia dizer alegorias de amor, desisti. mais do que isso, figo e plêiades evocam natural liberdade, mesmo que um esteja esborrachado no chão e outro tão distante no céu.

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 saiba mais


domingo, 23 de agosto de 2020

seis personagens pretos - literatura para vestibular



                                                    [ carolina m de jesus ]

assunto visceral esse do racismo

na literatura, chama atenção o tema pouco explorado

atenção para estes nomes:

[ ordem aleatória ]

mãitina
campo geral - rosa

bertoleza
o cortiço - azevedo

sancha
a falência - julia  

prudêncio
m p brás cubas - machado

chica da silva
romanceiro da inconfidência - cecília

carolina de jesus
quarto de despejo - carolina


mãitina - adepta do candomblé; trabalhava com empregada; região do mutum,  contrasta com vó izidra, idosa católica e muito conservadora

bertoleza - confia em romão - português, branco - e se vê traída pelo amado quando este consegue frequentar a elite, depois de enriquecer com aluguel de quartos, no cortiço; bertoleza suicida-se assim que percebe que irá voltar a ser escravizada

sancha - trabalha na casa de tia de camila, é explorada, humilhada; ruth, filha de camila, chega a sugerir que ela fugisse -- vale notar que ruth, branca, não sugere que as tias parem de maltratá-la... é a negra que precisa fugir

prudêncio - viveu parte da infância sob as humilhações de brás cubas, da mesma idade; ao chegar à vida adulta, alforriado, comprava escravos e os tratava da mesma forma quando ele, prudêncio, era menino, usando do mesmo jargão de seu ex-dono: "cala boca, besta"

chica da silva - "é a chica que manda!" diz um dos versos do livro de cecília meireles; século 18, assim que se vê rodeada de joias e acolhida pelo homem branco, comporta-se como tal

carolina - no seu diário, carolina de jesus relata a vida paupérrima que vivia, na favela canindé, s paulo, século 20; carolina pensa em matar seus filhos e suicidar-se para evitar a chance de que a fome os consumisse e a raiva da miséria a que era submetida

- importante questionar como eram as relações dessas figuras com as demais da sociedade em que se inserem
- perceber as consequências de séculos de escravidão, no país
- perceber que boa parte da igreja católica foi conivente com escravatura -- o que explica, em muito, o silêncio da maioria de sua liderança, quando o assunto é racismo
- mesmo filho de mulher preta com um português, machado de assis nunca deu protagonismo a personagem preto; a bem da verdade, ele não teria obrigação alguma de fazer isso, mas que chama atenção, chama... talvez isso -- não dar destaque a pretos -- explique porque há uma quase unanimidade em torno de seu nome como melhor escritor etc... se abraçasse mais causas populares -- como fez lima barreto -- talvez perdesse o posto ... brasileiro, em geral, é conservador demais

outros destaques: negrinha (negrinha, lobato); grupos pretos; favelados (sobrevivendo no inferno, racionais); pedro (demônio familiar, alencar)





domingo, 3 de novembro de 2019

o cortiço - teste múltipla escolha






Homens e mulheres corriam de cá para lá com os tarecos ao ombro, numa balbúrdia de doidos. O pátio e a rua enchiam-se agora de camas velhas e colchões espocados. Ninguém se conhecia naquela zumba de gritos sem nexo, e choro de crianças esmagadas, e pragas arrancadas pela dor e pelo desespero. Da casa do Barão saíam clamores apopléticos; ouviam-se os guinchos de Zulmira que se espolinhava com um ataque. E começou a aparecer água. Quem a trouxe? Ninguém sabia dizê-lo; mas viam-se baldes e baldes que se despejavam sobre as chamas.
Os sinos da vizinhança começaram a badalar.
E tudo era um clamor.
A Bruxa surgiu à janela da sua casa, como à boca de uma fornalha acesa. Estava horrível; nunca fora tão bruxa. O seu moreno trigueiro, de cabocla velha, reluzia que nem metal em brasa; a sua crina preta, desgrenhada, escorrida e abundante como as das éguas selvagens, dava-lhe um caráter fantástico de fúria saída do inferno. E ela ria-se, ébria de satisfação, sem sentir as queimaduras e as feridas, vitoriosa no meio daquela orgia de fogo, com que ultimamente vivia a sonhar em segredo a sua alma extravagante de maluca. Ia atirar-se cá para fora, quando se ouviu estalar o madeiramento da casa incendiada, que abateu rapidamente, sepultando a louca num montão de brasas.

[AZEVEDO, Aluísio. O cortiço, ed Moderna]

Em O cortiço, o narrador está em terceira pessoa, onisciente, preocupado em oferecer uma visão crítico-analítica dos fatos. A sugestão de que o narrador é testemunha pessoal e muito próxima dos acontecimentos narrados aparece de modo mais direto e explícito em:

a) Fechou-se um entra-e-sai de marimbondos defronte daquelas cem casinhas ameaçadas pelo fogo.

b) Ninguém sabia dizê-lo; mas viam-se baldes e baldes que se despejavam sobre as chamas.


c) Da casa do Barão saíam clamores apopléticos.


d) A Bruxa surgiu à janela da sua casa, como à boca de uma fornalha acesa.


e) Ia atirar-se cá para fora, quando se ouviu estalar o madeiramento da casa incendiada.


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resposta 
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E

[ a palavra "cá" indica o local de onde parte o discurso do narrador ]