uma experiência privada - chimamanda

 




"uma experiência privada", conto do livro "no seu pescoço", de chimamanda adichie.

a história se passa em kano, nigéria, durante onda de violência entre muçulmanos e cristãos.
chika é estudante de medicina de férias na cidade. ela é pega de surpresa pela violência enquanto está no mercado com sua irmã, nnedi. na confusão, ambas se separam. chika -- da etnia igbo -- se refugia numa pequena loja junto com uma mulher hausa muçulmana. é esta mulher hausa que pede para chika vir com ela para a pequena loja abandonada

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(...) Chika se pergunta se a mulher a está observando também, se sabe, por sua pele clara e pelo rosário de dedo feito de prata que sua mãe insiste em obrigá-la a usar, que é igbo e cristã. Mais tarde, Chika descobrirá que, quando ela e a mulher estavam conversando, muçulmanos hausas estavam atacando cristãos igbos a machadadas e apedrejando-os. Mas, naquele momento, ela diz:
“Obrigada por me chamar. Tudo aconteceu tão rápido, todo mundo correu e de repente eu estava sozinha, sem saber o que fazer. Obrigada”.
“Aqui lugar seguro”, diz a mulher, (...)
“Eles não entra em loja pequena-pequena, só loja grande-grande e no mercado.”
“Sim”, diz Chika. 
(...)
“Meus peitos arde igual pimenta” diz a mulher. 
 “O quê?”
 “Meus peitos arde igual pimenta.”
Antes que Chika consiga engolir o nó de surpresa em sua garganta e dizer qualquer coisa, a mulher sobe a blusa e abre o fecho frontal de um velho sutiã azul. (...)
 “Arde-arde igual pimenta”, diz, colocando as mãos em concha sob eles e se inclinando na direção dela, como se fizesse uma oferenda. Chika se move. (...)
Chika os examina com cuidado, estica a mão e os apalpa. “Você teve neném?”, pergunta. 
 “Tive. Um ano.”
“Seus mamilos estão ressecados, mas não parecem infectados. Depois de amamentar o neném, tem que usar um hidratante. E, quando estiver amamentando, tem que ter certeza de que o mamilo e essa outra parte aqui, a aréola, estão dentro da boca do neném.”
 A mulher olha longamente para Chika.
“Primeira vez isso. Eu ter cinco filhos.”

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apesar das diferenças culturais e sociais – chika é  estudante de medicina de classe média, enquanto a mulher é uma feirante humilde –, as duas desenvolvem conexão íntima e solidária ao longo das horas que passam escondidas. chika até auxilia a mulher que sente dores no seio: ela examina os seios da mulher e sugere hidrante , pois estavam feridos pela amamentação. 

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Mais tarde, ela vai ver as carcaças de carros queimados, com buracos com bordas denteadas no lugar das janelas e para-brisas, e imaginará esses carros espalhados pela cidade como fogueiras de piquenique, testemunhas silenciosas de tanta coisa. Vai descobrir que tudo aconteceu no estacionamento, quando um homem passou de carro sobre um exemplar do Alcorão que estava no acostamento, um homem que, por acaso, era igbo e cristão. Os homens que estavam ali por perto, homens que passavam o dia inteiro jogando damas, homens que, por acaso, eram muçulmanos, o arrancaram da picape, cortaram sua cabeça com um golpe de machadinha e o levaram até o mercado, pedindo que outros se juntassem a eles, pois o infiel tinha profanado o livro sagrado. 

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chika, quando finalmente sai do esconderijo, depara-se com um cadáver queimado, um símbolo da violência desumana que assola o país. aterrorizada, ela retorna à loja e recebe mais uma demonstração de gentileza da mulher, que limpa seu ferimento na perna.

demonstração de que as diferenças históricas podem ser superadas por atos de gentilieza, empatia e união.

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